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    Maurício Stycer

    Crise e falta de visão

    24/01/2016 02h00

    Ao final do primeiro trimestre de 2015, o número de assinantes de TV paga chegou a 19,75 milhões, sugerindo que o Brasil logo atingiria o sonhado patamar de 20 milhões. No segundo trimestre, porém, houve uma pequena queda, para 19,63 milhões, adiando a chegada na marca simbólica.

    O terceiro trimestre também registrou discreto crescimento negativo (19,5 milhões), mas os executivos do setor mantiveram a fleuma, negando a existência de crise. Até que no último trimestre do ano a situação piorou bastante.

    Os dados mais recentes da Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações) mostram que o Brasil chegou ao final de novembro com 19,16 milhões de assinantes de TV paga. E nada indica que a curva descendente será revertida nos próximos meses.

    A perda de quase 600 mil assinantes entre março e novembro não dá a dimensão completa do problema. Faltam dados, por exemplo, sobre o número de consumidores que não cortaram o cabo, mas optaram por trocar seus pacotes, buscando pagar menos.

    A situação econômica do país, evidentemente, é a vilã principal da crise que ameaça o setor. Qualquer família que se vê diante da necessidade de cortar custos provavelmente coloca o pacote de TV por assinatura no topo da sua lista de itens não essenciais.

    Não considero irrelevante, porém, a pressão de outros fatores. Um deles, tão antigo quanto a própria TV por assinatura, é a fartura de serviços clandestinos (o famoso "gatonet"), cujo alcance real é impossível de mensurar.

    Também acho que não se deve ignorar o crescimento da Netflix no Brasil, oferecendo um vasto cardápio de filmes e séries a partir de R$ 19,90 mensais. A empresa, infelizmente, não divulga seus números, mas apenas dá pistas de que o país é um mercado muito relevante em sua estratégia, até o momento bem-sucedida, de expansão global.

    Também é preciso levar em conta que os jovens com acesso a banda larga, um número ainda limitado no país, não precisam mais da televisão para se informar ou entreter. Com uma boa internet hoje, vê-se tudo. E, se não houver constrangimento de apelar para a pirataria, de graça.

    Todo este quadro não poderia ser mais interessante para as redes de TV aberta. Ainda que sintam os efeitos da recessão, por conta da queda da receita com publicidade, elas seguem como a opção de entretenimento gratuito mais conhecida e acessível para o espectador.

    É surpreendente, neste sentido, que as principais emissoras ainda considerem janeiro como um mês de férias para elas próprias. Com exceção da Globo, que começou o ano em ritmo alucinante, com dez estreias, os demais canais seguem oferecendo reprises ou programas gravados em 2015.

    Considerar, nesta altura do campeonato, que o ano na televisão só começa depois do Carnaval mostra não apenas ignorância em relação ao panorama atual como falta de ambição.

    Parece evidente que há um espectador à solta por aí, em busca de entretimento mais compatível com o atual tamanho do seu bolso. Oferecer reprises no horário nobre, como SBT, Record, Band e RedeTV! não se constrangem de fazer, é um tiro no pé.

    mauricio stycer

    É jornalista, repórter e crítico e autor de 'Adeus, Controle Remoto'.
    Escreve aos domingos.

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