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    Maurício Stycer

    Globo pode apostar em séries ousadas, mas teme desagradar o público

    14/08/2016 02h09

    Com estreia programada para 22 de agosto, "Justiça" é uma aposta da Globo que merece atenção. Não exatamente por seu tema, o drama de quatro pessoas condenadas por diferentes crimes, mas pela forma de contar estas histórias, a nova série mostra o interesse da emissora em exigir um pouco mais do seu espectador.

    "Justiça" irá ao ar de segunda a sexta (menos às quartas) durante cinco semanas. A cada dia, o público seguirá uma das histórias. O desfecho do episódio de segunda-feira só terá continuidade sete dias depois. E assim com as demais.

    Como toda a ação se passa em uma mesma cidade, Recife, os protagonistas das outras histórias se cruzam em todos os episódios.

    Em alguns casos, contracenam; em outros, são apenas figurantes de situações alheias.

    Vários filmes conhecidos já desenvolveram narrativas com esta estrutura, como "Short Cuts" (1993), de Robert Altman, "Crash" (2004), de Paul Haggis, e "Babel" (2006), de Alejandro González Iñárritu.

    Em meados de julho, a convite da Globo, depois de assistir a cenas de vários episódios, conversei com José Luiz Villamarim, o diretor de "Justiça".

    Villamarim está por trás de alguns produtos recentes de reconhecida qualidade, as novelas "Avenida Brasil" e "O Rebu" e as séries "O Canto da Sereia" e "Amores Roubados".

    "O que acho legal da série é esse formato. A gente tem que avançar na televisão. Depois dos seriados americanos, de tudo que aconteceu na televisão, o nosso desejo é que avance. Temos que reeducar o nosso espectador, de certa maneira", disse Villamarim em resposta à pergunta sobre a importância da série. "Isso, pra mim, é muito importante. É importante a empresa estar fazendo isso", acrescentou.

    Uma das peculiaridades –e limitações– do mercado de televisão no Brasil é justamente o fato de que as maiores ousadias estejam sendo propostas pela Globo, um canal aberto e gratuito, movido por audiência de massa e publicidade.

    Ao mesmo tempo que é a única emissora com potencial cacife (leia-se recursos) para produzir programas mais desafiadores, a Globo marca passo por temer desagradar uma parcela do público (e dos anunciantes, em consequência) que está viciada em novelas com conteúdo tatibitate.

    É o oposto do que sucede nos Estados Unidos. É consenso que o grande avanço na qualidade das séries foi impulsionado pela HBO, um canal de nicho, que sempre baseou seu modelo de negócios no número de assinantes.

    Mais recentemente, a Netflix se estabeleceu com lógica semelhante. Dependendo exclusivamente de assinantes, sem publicidade, o serviço de distribuição on-line passou a investir pesadamente em produção de conteúdo –e um de seus alvos principais é justamente o público mais qualificado, do ponto de vista socioeconômico.

    Ted Sarandos, diretor de conteúdo da Netflix, disse não estar preocupado com o volume de séries sendo produzidas no mercado americano: "Há um excesso de séries medíocres na TV tradicional".

    RIO-2016 X NOVELAS

    Estou no Rio acompanhando os Jogos Olímpicos para o UOL. Tenho ouvido uma mesma pergunta de colegas estrangeiros: por que a Globo não exibe competições em seu horário nobre? Até dei entrevista a uma TV canadense sobre o assunto. A resposta é óbvia para nós, brasileiros, mas nem tanto para os colegas de outros cantos do mundo. Por causa das novelas.

    mauricio stycer

    É jornalista, repórter e crítico e autor de 'Adeus, Controle Remoto'.
    Escreve aos domingos.

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