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    Maurício Stycer

    Volta de 'Gilmore Girls', 'Twin Peaks' e outros pode ser sinal de crise criativa

    26/02/2017 02h05

    Ao longo de 2016, foram ao ar nos Estados Unidos 455 "programas de TV roteirizados" (o termo inclui séries, minisséries e animações, basicamente). O número leva em conta as estreias e as novas temporadas de atrações em andamento que foram exibidas na TV aberta, paga e em serviços de streaming.

    Segundo dados do canal FX, esse volume recorde representa um crescimento de 8% em relação a 2015 (421 programas) e de 71% em relação a 2011 (266 programas). Se a pesquisa retrocede a 2006, dez anos atrás, o salto é ainda mais impressionante. Naquele ano, foram ao ar "apenas" 192 programas.

    No final de 2014, John Landgraf, presidente do FX, já alertava para o excesso de produção, falando sobre o risco de comprometer a capacidade das empresas envolvidas.

    Saeed Adyani/Netflix
    Lauren Graham e Alexis Bledel em cena de 'Gilmore Girls: A Year in the Life
    Lauren Graham e Alexis Bledel em cena de 'Gilmore Girls: A Year in the Life'

    Ao aumento da produção correspondeu uma variedade maior de temas e gêneros, buscando atender a públicos cada vez mais específicos. Essa partilha da audiência em nichos acarreta, porém, um problema de ordem industrial, alertou Landgraf, na ocasião.

    Em determinado momento, diz ele, "a fragmentação se torna tão grande que a capacidade de manter e alimentar esses programas sob a perspectiva financeira fica comprometida" (tratei do tema no texto "O fantasma da 'bolha'", em 2014).

    Apesar das dificuldades que acarreta para a indústria, a pergunta que interessa mais de perto ao leitor-espectador é outra: como este crescimento da produção impacta o conteúdo?

    Um dos efeitos mais visíveis deste boom é o crescimento de "remakes" e "reboots". O primeiro termo designa o exercício de refazer um programa tal como ele era anteriormente (caso, por exemplo, de "Raízes", exibida pela Globo em janeiro, que é uma versão idêntica à minissérie de 1977).

    O segundo termo, inspirado da linguagem da informática ("reinicializar"), tem sido usado para falar de séries ou filmes antigos que são retomados de outro ponto de partida, sem continuidade com o programa original.

    É o caso, por exemplo, de "Gilmore Girls", uma série exibida na TV entre 2000 e 2007, que no final de 2016 foi relançada pelo Netflix na forma de quatro filmes de 90 minutos.

    Entre "reboots" planejados ou em produção nos EUA, há títulos para todos os gostos, desde o genial "Twin Peaks", refeito por seu criador original, David Lynch, até um clássico kitsch como "Dinastia", passando por "Will & Grace", "Prison Break", "Magnum", "Swat" etc.

    Diante desta lista enorme, a tentação é falar numa aposta da indústria em nostalgia. Mas tenho dúvidas se é isto mesmo ou, simplesmente, uma muleta em um momento de esgotamento criativo.

    Nostalgia sempre foi um filão e um bom negócio na televisão. Um caso recente é o da série "Strangers Things", do Netflix, cuja segunda temporada vai ao ar neste ano.

    O programa não é "remake" nem "reboot" de nada, mas conquistou o público, sem fazer muito esforço, recriando a atmosfera de filmes com temática sobrenatural dos anos 1980. Protagonizada por quatro meninos, a série evoca lembranças de filmes como "Conta Comigo", "Contatos Imediatos do Terceiro Grau", "Os Goonies", "E.T. - O Extraterrestre", entre outros, num movimento explícito de sedução ao espectador que possui estas referências.

    mauricio stycer

    É jornalista, repórter e crítico e autor de 'Adeus, Controle Remoto'.
    Escreve aos domingos.

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