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    Maurício Stycer

    Em sua história, a Globo é confrontada por decisões editoriais polêmicas

    04/06/2017 02h25 - Atualizado às 00h22
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    Nenhuma empresa de comunicação tem sido tão cobrada a dar satisfações sobre as suas opções editoriais quanto a Globo. Vejo pelo menos três razões para isso e as enumero a seguir, sem a intenção de hierarquizá-las.

    O grande número de decisões graves tomadas de forma equivocada ao longo de sua história criou um passivo do qual a emissora não consegue se livrar. Mesmo tendo reconhecido alguns dos erros, a desconfiança de que está sempre pronta a cometer algum desatino se mantém presente.

    O fato de, mesmo sendo uma concessão pública, não conseguir disfarçar os seus interesses em matérias políticas e econômicas, ainda que não constitua uma exceção entre as emissoras de TV, ganha dimensão especial na Globo.

    O tamanho que a emissora tomou, por seus méritos, dá a ela um poder extraordinário de reverberar e influenciar os seus pontos de vista, bem embalados em opções editoriais.

    Tem sido notável, nos últimos anos, o esforço de mudar esta imagem e tentar convencer o espectador de que está diante de um império justo e imparcial.

    Na série em que comemorou os 50 anos da TV, exibida em abril de 2015, o "Jornal Nacional" buscou fixar a ideia de que a emissora foi uma grande vítima da censura, deixando em segundo plano o apoio que deu à ditadura militar no período.

    Como lembram as pesquisadoras Christina Ferraz Musse e Cláudia Thomé, em "Memórias (Re)construídas pelo Jornal Nacional", "o relato da memória é uma construção do presente".

    No artigo, elas avaliam que na série sobre os 50 anos o telejornal ampliou "seu poder de mandar olhar" e, passando a limpo a sua história, indicar "o que deverá ser guardado pelo público".

    O artigo integra a coletânea "Telejornalismo e Poder" (ed. Insular, 340 págs., R$ 48), lançada no final de 2016 pela Rede de Pesquisadores em Telejornalismo, formada por professores de diferentes universidades do país.

    A Globo, naturalmente, é o tema principal de vários dos ensaios. A ideia de que a emissora criou uma "realidade parcial", como definem Alfredo Vizeu e Laerte Cerqueira, percorre boa parte dos textos.

    Mesmo que, em muitos casos, os argumentos não sejam contundentes, a coletânea transpira essa má impressão ao analisar fatos que se estendem à cobertura do impeachment de Dilma Rousseff e à cassação de Eduardo Cunha.

    Um ponto frequentemente lembrado em defesa da Globo é a qualidade –indiscutível– de seus profissionais. O argumento, porém, desvia a discussão. Que culpa tem o time de repórteres se a emissora decidiu não dar qualquer informação sobre a greve geral de 28 de abril nos dias que a antecederam?

    Ou se a GloboNews optou por não noticiar, no telejornal das 19h do último domingo (28), a enorme manifestação por eleições diretas realizada no Rio? Ou se, às 20h, o assunto foi tratado friamente e de forma editorializada ("Os manifestantes pediram pacificamente eleições diretas, o que não está previsto pela Constituição nestas circunstâncias")?

    É natural, por tudo isso, que o papel da Globo no mais recente escândalo político esteja chamando tanta atenção.

    Num intervalo de 22 horas, o jornal "O Globo" publicou as primeiras notícias, todos os telejornais da emissora reverberaram com bumbo. Só depois disso é que se ouviu o áudio com as gravações que embasaram todas essas decisões.

    No auge do frenesi, o jornal chegou a noticiar que o presidente já havia decidido renunciar. O equívoco, ainda que prontamente corrigido, trouxe a lembrança de muitos outros erros.

    mauricio stycer

    É jornalista, repórter e crítico e autor de 'Adeus, Controle Remoto'.
    Escreve aos domingos.

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