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    Maurício Stycer

    Condenado, SBT exibe sentença na tela como créditos de um filme

    23/07/2017 02h04

    O "Programa do Ratinho" se encerrou no último dia 12 com um número musical do Biquíni Cavadão. O que tornou a apresentação original, única, foi a forma como o SBT a exibiu. Enquanto os músicos ocupavam dois terços da tela, na parte restante começou a correr, como se fossem créditos de um filme, uma sentença judicial.

    A sentença relatava a condenação, em segunda instância, de Ratinho e do SBT por injúria e difamação contra um procurador do Distrito Federal. Em junho de 2009, em seu programa, comentando uma ocorrência policial, o apresentador havia chamado o procurador de "cidadão despreparado", "descarado" e "machão", entre outros qualificativos.

    Consultado, o SBT considerou que a sentença "abriu um precedente sério contra a liberdade de expressão".

    Ao confirmar a decisão da primeira instância, a 3ª Turma Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal determinou o pagamento de R$ 50 mil ao procurador e "a veiculação da sentença no mesmo programa".

    Foi este ponto que chamou mais a atenção, uma vez que nenhum ser humano conseguiu ler corretamente a sentença nos três minutos em que ela correu na tela.

    A situação teria se repetido se fosse um direito de resposta. A lei, de 2015, estabelece que as emissoras devem garantir o mesmo destaque e duração da matéria que causou a ofensa, sem especificar como fazer isso.

    Ao sancionar a lei, a então presidente Dilma vetou um dispositivo que tratava justamente desta questão. O texto original previa que "tratando-se de veículo de mídia televisiva ou radiofônica, o ofendido poderá requerer o direito de dar a resposta ou fazer a retificação pessoalmente".

    A Abert (Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão) aplaudiu o veto. Mas em novo projeto de lei, apresentado em 2016, o senador Roberto Requião (PMDB-PR) propôs uma retificação ao texto original, deixando claro que a opção de responder "pessoalmente" não significava dizer que o ofendido iria se dirigir ao estúdio da TV para falar.

    Segundo ele, a resposta do ofendido deveria ser veiculada por meio de texto escrito, e lida por alguém da própria TV, ou por gravação de áudio ou vídeo, feita pelo próprio ofendido ou por alguém de sua escolha.

    A proposta prevê, ainda, que o teor da resposta deve ser aprovado previamente pela emissora de TV ou, em caso de recusa, após homologação da Justiça.

    Considerando que o princípio do direito de resposta é fundamental, seria importante, de fato, encontrar uma forma mais adequada de apresentá-lo na televisão do que exibindo uma sentença na tela.

    Fabio Braga/Folhapress
    O apresentador Ratinho, do SBT, em maio de 2016
    O apresentador Ratinho, do SBT, em maio de 2016

    "NOBODY SPEAK"

    A liberdade de imprensa deve ser defendida sempre, em qualquer situação, mesmo quando quem está na berlinda é um site famoso pela sua abordagem agressiva, antipática e sensacionalista da vida das celebridades. Esta é uma das teses centrais do documentário "Nobody Speak: Trials of the Free Press", disponível no catálogo da Netflix desde o final de junho.

    O filme de Brian Knappenberger descreve a batalha judicial enfrentada pelo site Gawker por causa da publicação de um vídeo íntimo de Hulk Hogan, o famoso lutador de luta livre. O processo terminou com uma condenação de US$ 140 milhões (depois reduzida, em acordo, para US$ 31 milhões) e o pedido de falência do Gawker.

    O detalhe mais importante da história foi a descoberta, durante o litígio, que a causa de Hogan estava sendo secretamente patrocinada pelo bilionário Peter Thiel, cocriador do PayPal e um dos primeiros financiadores do Facebook. Homossexual não assumido, Thiel foi "tirado do armário" por uma matéria do Gawker em 2007. Sua vingança foi acabar com o site.

    Assista ao trailer legendado de 'Nobody Speak'

    Assista ao trailer legendado de 'Nobody Speak'

    mauricio stycer

    É jornalista, repórter e crítico e autor de 'Adeus, Controle Remoto'.
    Escreve aos domingos.

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