O "Programa do Ratinho" se encerrou no último dia 12 com um número musical do Biquíni Cavadão. O que tornou a apresentação original, única, foi a forma como o SBT a exibiu. Enquanto os músicos ocupavam dois terços da tela, na parte restante começou a correr, como se fossem créditos de um filme, uma sentença judicial.
A sentença relatava a condenação, em segunda instância, de Ratinho e do SBT por injúria e difamação contra um procurador do Distrito Federal. Em junho de 2009, em seu programa, comentando uma ocorrência policial, o apresentador havia chamado o procurador de "cidadão despreparado", "descarado" e "machão", entre outros qualificativos.
Consultado, o SBT considerou que a sentença "abriu um precedente sério contra a liberdade de expressão".
Ao confirmar a decisão da primeira instância, a 3ª Turma Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal determinou o pagamento de R$ 50 mil ao procurador e "a veiculação da sentença no mesmo programa".
Foi este ponto que chamou mais a atenção, uma vez que nenhum ser humano conseguiu ler corretamente a sentença nos três minutos em que ela correu na tela.
A situação teria se repetido se fosse um direito de resposta. A lei, de 2015, estabelece que as emissoras devem garantir o mesmo destaque e duração da matéria que causou a ofensa, sem especificar como fazer isso.
Ao sancionar a lei, a então presidente Dilma vetou um dispositivo que tratava justamente desta questão. O texto original previa que "tratando-se de veículo de mídia televisiva ou radiofônica, o ofendido poderá requerer o direito de dar a resposta ou fazer a retificação pessoalmente".
A Abert (Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão) aplaudiu o veto. Mas em novo projeto de lei, apresentado em 2016, o senador Roberto Requião (PMDB-PR) propôs uma retificação ao texto original, deixando claro que a opção de responder "pessoalmente" não significava dizer que o ofendido iria se dirigir ao estúdio da TV para falar.
Segundo ele, a resposta do ofendido deveria ser veiculada por meio de texto escrito, e lida por alguém da própria TV, ou por gravação de áudio ou vídeo, feita pelo próprio ofendido ou por alguém de sua escolha.
A proposta prevê, ainda, que o teor da resposta deve ser aprovado previamente pela emissora de TV ou, em caso de recusa, após homologação da Justiça.
Considerando que o princípio do direito de resposta é fundamental, seria importante, de fato, encontrar uma forma mais adequada de apresentá-lo na televisão do que exibindo uma sentença na tela.
Fabio Braga/Folhapress | ||
O apresentador Ratinho, do SBT, em maio de 2016 |
"NOBODY SPEAK"
A liberdade de imprensa deve ser defendida sempre, em qualquer situação, mesmo quando quem está na berlinda é um site famoso pela sua abordagem agressiva, antipática e sensacionalista da vida das celebridades. Esta é uma das teses centrais do documentário "Nobody Speak: Trials of the Free Press", disponível no catálogo da Netflix desde o final de junho.
O filme de Brian Knappenberger descreve a batalha judicial enfrentada pelo site Gawker por causa da publicação de um vídeo íntimo de Hulk Hogan, o famoso lutador de luta livre. O processo terminou com uma condenação de US$ 140 milhões (depois reduzida, em acordo, para US$ 31 milhões) e o pedido de falência do Gawker.
O detalhe mais importante da história foi a descoberta, durante o litígio, que a causa de Hogan estava sendo secretamente patrocinada pelo bilionário Peter Thiel, cocriador do PayPal e um dos primeiros financiadores do Facebook. Homossexual não assumido, Thiel foi "tirado do armário" por uma matéria do Gawker em 2007. Sua vingança foi acabar com o site.
Assista ao trailer legendado de 'Nobody Speak'
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É jornalista, repórter e crítico e autor de 'Adeus, Controle Remoto'.
Escreve aos domingos.