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    Michel Laub

    Perguntas ao escritor

    DE SÃO PAULO

    19/12/2014 02h00

    –Se seus livros não existissem, ia fazer alguma diferença para alguém além de você?

    –Como seus defeitos interferem no que você escreve? A vaidade, por exemplo.

    –Entre escrever um grande livro cujo tema magoará uma pessoa muito próxima e querida ou jamais escrever um grande livro, o que você escolheria?

    –Se um livro seu muito elogiado se baseasse num fato doloroso da sua biografia, que causou a morte de pessoa(s) muito próxima(s) e querida(s), você preferiria que isso não tivesse acontecido e o livro não existisse?

    –Alguma vez você aprendeu algo com uma crítica? Se aprendeu, isso mudou seu jeito de escrever?

    –Se mudou, existe diferença entre escrever para agradar à crítica e, como os autores de best-sellers que você despreza, para agradar ao público?

    –O que significa o conceito de "independência" (aspas do entrevistador) no universo literário? Não publicar por grandes editoras? Não ter os livros resenhados pela grande imprensa? Não participar de eventos literários patrocinados por estatais ou bancos? Ter posição política diversa da que você imagina ser a posição política da média dos integrantes desse universo?

    –Só por curiosidade: que posição seria essa? Votar no governo? Criticar o governo? Se declarar contra as panelinhas e as injustiças? Ser contra ou a favor da descriminalização do aborto, da especulação imobiliária, das ciclovias, do agronegócio?

    –Só por curiosidade 2: quem exerce o "poder" (aspas do Facebook) no meio cultural? Os que elogiam você, inclusive em reuniões de júris de prêmios que concedem milhares de reais ao elogiado, fazem parte da conspiração? Alguma vez você disse não a tais ofertas de leite e mel?

    –Em que turno do dia você escreve? Usa computador ou telex? Tem algum animal de estimação?

    –Bebe?

    –Qual é o seu signo?

    –O que você sente quando vai tirar a foto que será publicada na orelha do livro?

    –O que passa pela sua cabeça quando um(a) fã em situação afetiva "vulnerável" (aspas do tribunal e da carceragem) convida você para um café?

    –Ficar mais velho, mais cético e em vários aspectos mais cínico é bom ou ruim para a literatura que você se propõe a fazer?

    –Quando você lê o livro de um escritor mais ou menos da sua idade, que disputa mais ou menos os mesmos espaços que você, a torcida é para que o texto seja bom ou ruim?

    –Você gosta de todos os livros publicados por seus amigos? Se não gosta, isso é um segredo seu, sua opinião foi dada ao referido amigo ou você fala mal dele pelas costas?

    –Você convive fraternalmente com alguém que, em público ou particular, declarou não gostar dos livros que você escreveu?

    –Se pedem para você explicar o sentido de sua obra numa entrevista, como é a escolha das frases? O critério é a sinceridade, que refletirá de modo desorganizado e hesitante as décadas de um trabalho igualmente desorganizado e hesitante, baseado mais em intuição emocional que em racionalidade? Ou é melhor resumir tudo em termos claros e coerentes, de preferência inteligentes e impactantes, quando não charmosos e engraçados, que causarão efeito imediato de simpatia e interesse no público, garantindo mais entrevistas (e vendas, e cachês de feiras de livro) para quem depende dessa exposição para pagar boa parte das contas?

    –Qual é a pergunta que nunca foi feita e que explicaria, mais do que as centenas de outras perguntas já feitas por pressa, falta de espaço, preguiça, ignorância ou desinteresse (merecido) na sua pessoa, aquilo que você escreve –e, em larga medida, porque as coisas não são tão separadas assim, aquilo que você é?

    –Qual é o seu time do coração?

    –Antônio Carlos Magalhães dizia que a maior habilidade de um político é perceber se o seu interlocutor quer dinheiro, prestígio ou carinho, e que o único pecado imperdoável é errar a avaliação –dando carinho, digamos, a quem quer dinheiro. Então, se você pudesse se ver à distância, e sendo um bom velhinho de si mesmo neste Natal, botaria o escritor em questão na lista de mais vendidos, no topo das citações acadêmicas e jornalísticas do nosso tempo ou daria um abraço gostoso nele?

    michel laub

    Escreveu até julho de 2015

    É escritor e jornalista. Publicou seis romances, entre eles "Diário da queda" (2011) e "A maçã envenenada" (2013).

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