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    Mirian Goldenberg

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    26/08/2014 01h50

    O sentimento de tristeza é um dos temas mais delicados da minha pesquisa atual. É quase um tabu falar de tristeza em uma cultura na qual a felicidade é um valor a ser cultivado.

    No entanto, uma professora de 52 anos revelou a sua tristeza e a falta de compreensão dos familiares e amigos.

    "Tenho me sentido muito triste, choro, me emociono com qualquer coisa. Quero enfrentar a tristeza sem remédios. Meu marido não entende por que não tomo antidepressivo. Diz que não estou me esforçando para ficar bem. Acha que sou culpada e que quero me fazer de vítima".

    A medicalização dos sentimentos e o imperativo de ser feliz a qualquer preço provocam a estigmatização da tristeza e a certeza de que ela deve e pode ser "curada" rapidamente.

    "Minha melhor amiga me deu de presente de aniversário uma caixa de Rivotril e outra de Lexapro. Ela não aguenta me ver triste, acha que estou deprimida, que preciso me curar. Até minha analista acha que devo tomar um antidepressivo. É um massacre, uma violência! Parece que estou ameaçando tudo o que elas acreditam quando prefiro lidar com a tristeza sem remédios".

    Ela diz que se preocupa mais com o sofrimento que está causando aos outros do que com a própria dor.

    "É muito difícil compreender e conviver com a tristeza. Eu entendo porque algumas pessoas se suicidam. Não é por egoísmo, como muitos pensam. É exatamente o contrário. Elas não querem causar sofrimento naqueles que elas mais amam. Querem libertá-los. Não querem ser um peso que atrapalha a vida dos outros. Acreditam que eles serão mais felizes sem o sofrimento que elas provocam".

    No momento em que mais precisa de compreensão, apoio e amor, ela só recebe críticas, acusações e até mesmo agressões. Ela acha que um abraço carinhoso e uma escuta atenciosa ajudariam muito mais do que remédios. A sensação de ser rejeitada e de estar absolutamente só nessa luta agrava mais a tristeza.

    "Eu sofro sozinha, choro sozinha, tento me cuidar sozinha, e ainda busco parecer que estou bem só para não incomodar ninguém. Tenho vergonha e me sinto culpada por estar tão triste. Não sei como e quando a tristeza vai embora. A minha maior angústia é descobrir: será que existe alguma saída sem tomar remédios?"

    mirian goldenberg

    É antropóloga e professora da Universidade Federal do Rio de Janeiro. É autora de 'Coroas: corpo, envelhecimento, casamento e infidelidade'. Escreve às terças, a cada duas semanas.

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