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    Mirian Goldenberg

    "Tá melhor que a gente!"

    25/02/2015 02h00

    Carnaval de 2015, zona sul do Rio de Janeiro, sábado, às 17h.

    Na calçada do shopping RioDesign, no Leblon, em uma das ruas mais movimentadas da cidade, um casal se beija apaixonadamente.

    Imediatamente se forma, ao redor do casal, um círculo com quinze adolescentes. Eles dão risadas, gritam, aplaudem alegremente.

    Uma jovem fantasiada de princesa grita: "Tá melhor que a gente!"

    Um adolescente pergunta: "Será que eles são casados?"

    Uma garota responde: "Lógico que não, eles não usam aliança".

    Durante alguns segundos o casal fica desconcertado com a situação inusitada. Não imaginavam que poderiam se tornar o foco de interesse de tantos jovens no meio do Carnaval carioca, onde milhares de outros casais também se beijavam, se abraçavam e protagonizavam cenas muito mais ousadas.

    Por que eles, que nem estavam fantasiados, chamaram atenção daqueles jovens? A mulher logo percebe o motivo e fica muito envergonhada. Ela se sente ridícula e quer fugir da situação constrangedora.

    Como dois velhos de mais de 60 anos têm a coragem de se beijar apaixonadamente em público?

    O homem de cabelos brancos ri muito e beija novamente a mulher. Ele a abraça carinhosamente e diz baixinho: "Você é linda, eu te amo muito e não tenho a menor vergonha de demonstrar o meu tesão por você. Você é o grande amor da minha vida".

    Ele responde aos jovens: "Somos casados há 43 anos. Não precisamos de aliança para provar que nos amamos e que temos um compromisso de fidelidade e de cuidado um com o outro".

    O primeiro beijo deles foi em 1968, no meio de uma passeata. Apesar de tantos anos de casados, eles ainda se sentem jovens e revolucionários. Eles ainda se desejam e fazem amor frequentemente. Eles ainda se beijam apaixonadamente, em público, como na primeira vez.

    Ele sente orgulho e admiração pela esposa e quer que os outros saibam disso. Ela se sente feliz por ser tão amada e desejada, mesmo depois de tantos anos de casamento.

    A garota vestida de princesa repete então a frase que fez sucesso e é ainda mais aplaudida pelos outros jovens que se juntaram ao círculo: "Tá melhor que a gente!"

    Afinal, quem não quer ser feliz e apaixonado aos 60, 70, 80, 90 e (por que não?) aos 100 anos?

    mirian goldenberg

    É antropóloga e professora da Universidade Federal do Rio de Janeiro. É autora de 'Coroas: corpo, envelhecimento, casamento e infidelidade'. Escreve às terças, a cada duas semanas.

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