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    Mirian Goldenberg

    "Acabou!"

    22/03/2016 02h10

    O que as pessoas fazem para sobreviver emocionalmente em meio a tantas crises?

    Uma empresária de 57 anos disse que está muito deprimida e até teve ataques de pânico em função da atual crise econômica e política.

    "Procuro adotar a filosofia de viver um dia de cada vez. Meu mantra é: concedei-me a serenidade necessária para aceitar as coisas que não posso mudar, coragem para modificar aquelas que posso e sabedoria para distinguir umas das outras".

    Ela disse que seu maior sofrimento é não conseguir enxergar alguma saída para a crise.

    "Não gosto de tomar remédio para dormir ou para me acalmar. E, por isso, sofro demais com a minha insônia. Fiz muitos anos de análise, gastei uma fortuna com todos os tipos de terapia. Mas, na verdade, a única vez que um analista me ajudou foi quando eu estava em dúvida se voltava ou não para o meu ex-marido. Levei uma folha com tudo anotado. Os prós: sentia falta das nossas conversas, tinha medo de ficar sozinha para sempre, estava com ciúmes da nova vida dele. Os contras: brigávamos o tempo todo, ele me irritava de propósito, só sabia me criticar e destruir minha autoestima".

    O analista pegou a folha da sua mão e a rasgou em pedacinhos. Depois disse: "Acabou!".

    "Eu continuava insistindo em ruminar o passado: 'Onde foi que eu errei? Por que não deu certo? Será que eu estaria mais feliz se não tivesse me separado?' Não importava mais se minha decisão de separar tinha ou não sido certa: acabou! Não interessava se eu estava com medo de ficar sozinha para sempre ou com ciúmes dele: acabou! Foi a resposta que eu precisava para não me atormentar mais: acabou!".

    Ela conclui: "Antes, quando tinha algum problema profissional ou pessoal, ficava paralisada. Falava com muitas pessoas, ouvia conselhos e opiniões contraditórias, ficava perdida e cada vez mais angustiada. Hoje, quando estou insegura com alguma questão, escrevo em uma página todos os prós e contras, analiso cada uma das possibilidades, tomo uma decisão e, depois, rasgo em pedacinhos o papel. Digo para mim mesma: Acabou! É uma verdadeira libertação dos meus medos, ansiedades e preocupações e, só assim, consigo dormir".

    Por que temos tanta dificuldade para aceitar que, simplesmente, acabou?

    mirian goldenberg

    É antropóloga e professora da Universidade Federal do Rio de Janeiro. É autora de 'Coroas: corpo, envelhecimento, casamento e infidelidade'. Escreve às terças, a cada duas semanas.

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