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    Mônica Bergamo

    'Aprendiz' de Doria, subprefeito posta tudo na rede e tem 'vergonha' de Aécio

    16/07/2017 02h00

    Um político do PSDB caminha todo sorridente pela repartição cumprimentando os funcionários. "Bom dia, prefeito!", diz um guarda. "Oi prefeito, como vai?", fala outro servidor.

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    O tucano em questão não é o prefeito João Doria, mas seu discípulo Paulo Mathias, 26, administrador da região mais rica da cidade: ele comanda a prefeitura regional de Pinheiros, que abrange da Vila Madalena à Vila Olímpia, passando por Pinheiros, Jardins e Itaim Bibi.

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    Foi ainda em campanha —da qual Mathias foi coordenador— que Doria disse que iria trocar o nome das áreas administrativas da cidade, então chamadas de subprefeituras. "O nome 'sub', além de ter uma conotação de coisa menor, não dá dimensão do que queremos fazer", diz.

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    Presidente da juventude estadual do PSDB por três anos, ele é formado em gestão pública e começou na política aos 17 anos. Tentou se eleger deputado estadual em 2014, sem sucesso.

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    A caminho de inspecionar uma obra, Mathias explica à repórter Letícia Mori que duas de suas principais preocupações são melhorar a poda de árvores —a região é uma das mais arborizadas da cidade— e reformar praças e rotatórias.

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    De tênis Nike e calça jeans, ele desce do carro em um canteiro da avenida Brasil que está sendo reformado. Chama uma assistente para ajudá-lo a gravar um vídeo. "[Vamos filmar] aqui, com os homens trabalhando ao fundo."

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    Como Doria, ele posta dezenas de vídeos nas redes sociais visitando obras, respondendo a perguntas, entrevistando personalidades e até pintando muros à meia-noite na marginal Pinheiros para apagar pichações. "Não é marketing, é transparência." Na quarta (12), quando o ex-presidente Lula foi condenado a 9 anos e meio de prisão, ele postou um vídeo comemorando: "O Lula vai pra cadeia! Bandido!"

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    A sala de Mathias é cheia de homenagens a Doria, como uma revista "Forbes" com o prefeito na capa. "Olha aqui o santo Doria", diz ele, apontando para uma foto do prefeito na festa da vitória na eleição, com as mãos em forma de oração. "Me inspiro muito no João. Aprendi com ele a valorizar coisas pequenas, detalhes", diz Mathias, que deixa bilhetes nas mesas de servidores que esquecem a luz acesa.

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    Ele elogia o fato de Doria ligar para subordinados de madrugada ("tem que trabalhar!"), mas jura que não faz o mesmo. "No máximo às 23h, né, meninas?", diz para as assessoras.

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    Mathias já foi criticado por anunciar em vídeo, na véspera da greve geral de 28 de abril, ao lado de funcionários da prefeitura regional, que eles passariam a noite no trabalho, já que o transporte público não funcionaria. "Somos a favor do direito de greve, mas não em dia de trabalho", chegou a dizer.

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    "Me expressei mal", afirma. "Esse episódio já foi superado. Expliquei que foram eles que pediram, algo totalmente espontâneo. São pessoas que amam o que fazem."

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    Terminada a gravação na avenida, o jovem parte para uma reunião. "Quem toca obra aqui em Pinheiros são as mulheres", diz. "São oito no meu gabinete, de dez pessoas que eu trouxe. Sigo o exemplo do João. No Lide [grupo fundado pelo prefeito] só tem mulher." E continua: "Sou um apaixonado por mulheres, gosto de trabalhar com mulher. E, embora obra pareça difícil, elas têm um zelo pelo detalhe que faz toda a diferença".

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    No trajeto, Mathias reclama de anúncios de limpeza de sofá e de "amarração para o amor" colados em postes. "Olha aí, emporcalham a cidade toda." Ele fala entusiasmado sobre a "Blitz da Amarração", operação para retirar propaganda irregular. Tem pedido para que moradores "sejam eles mesmos os fiscais" e arranquem os cartazes.

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    Na pausa para as fotos, Mathias comenta a proximidade do fotógrafo. "Aí a barriga chama atenção, né? Vai pegar todas as minhas imperfeições na face... Se fosse o João, não ia gostar", diz, rindo. Ele perdeu 25 kg nos últimos meses —tem corrido todo dia e mudou a alimentação. "Não é só vaidade, é para ter mais energia, pique."

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    Afilhado político de Geraldo Alckmin, defende o governador, que está entre os citados em delações da Operação Lava Jato. "Ele é um homem muito correto. Li as acusações. É uma coisa muito incipiente, não tem nenhuma evidência real de irregularidade."

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    Já para Aécio Neves não reserva tanta gentileza. "Me envergonho de ter pedido voto para ele em 2014. O país inteiro errou, né? Quem queria a Dilma e quem queria o Aécio. Já defendi que deveríamos expulsar o cara do partido. Ele tem o direito de se defender, mas que faça isso fora da legenda."

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    Mathias faz parte de um grupo de WhatsApp criado por empresários para apoiar a candidatura de Doria à Presidência, mas não crê que terá de escolher "entre João e Geraldo". "O João é leal. Não importa o que acontecer, os dois estarão juntos em 2018."

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    Embora seus pais sejam vizinhos de Doria no Jardim Europa, ele só conheceu o empresário pouco antes da campanha. Morou com a família até o ano passado —hoje está em um apartamento no Itaim. "É pequeno, 40 m². Para uma pessoa que passa o dia fora e é solteira, está bom", afirma. "Nossa, se sua namorada ouve isso você tá ferrado", diz seu chefe de gabinete, Fabrício Caruso.

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    "Quis dizer no sentido de que moro sozinho, ainda não casei", retruca. Para se redimir, cita a namorada, a publicitária Fabíola Farias, no vídeo ao vivo que faz à noite para responder a questionamentos de moradores do bairro. "Meu amor, se você estiver aí, prometo que saio logo do trabalho para jantarmos." E depois explica: "As pessoas querem ver o prefeito trabalhando, mas também querem ver que ele é uma pessoa como as outras, passeando, namorando".

    mônica bergamo

    Jornalista, assina coluna com informações sobre diversas áreas, entre elas, política, moda e coluna social. Está na Folha desde abril de 1999. Escreve diariamente.

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