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    Mônica Bergamo

    'Não tenho ai-ai-ai, ui-ui-ui', diz Tony Ramos sobre proximidade dos 70

    17/09/2017 02h00

    Tony Ramos conta que sua reação à prisão do empresário Joesley Batista, da JBS, no domingo (10), foi "como a de qualquer brasileiro. Primeiro, um susto. Depois, você fica triste. E então espera que a Justiça faça o seu serviço".

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    A primeira surpresa em relação à empresa ocorreu em março. A deflagração da operação Carne Fraca atingiu a imagem da Friboi, marca da JBS de que ele era garoto-propaganda. Tony decidiu manter o contrato depois que as irregularidades na mercadoria que anunciava não foram comprovadas. Diz que não se arrepende, não se envergonha e consome o produto ainda hoje: "Claro, a carne é boa, pô!".

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    Em maio, veio a divulgação da delação premiada em que Joesley confessava a compra de mais de mil políticos e revelava a gravação de conversa que teve com o presidente Michel Temer. O susto foi grande demais e o ator decidiu romper com a empresa, para não associar a imagem a "esse tipo de procedimento".

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    Apesar dos tempos turbulentos que acabaram atingindo seu próprio trabalho, fazendo com que ele abrisse mão de um contrato de R$ 5 milhões, Tony Ramos se diz confiante.

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    "Eu já vi vários momentos do nosso país. Vários. Momentos difíceis, tristes, esperançosos", diz. "Lamentavelmente, eu não consigo ser pessimista. Eu sou um incorrigível otimista. Amo minha nação como esse chão que eu conheço tão bem."

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    "Aqui quero viver e aqui quero escolher os homens que vão nos dirigir", afirma. "Hoje, eu não tenho nenhum [candidato]. E uma das coisas que mais me agradam em mim mesmo é nunca ter tido coloração político-partidária."

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    "Se eu ouvir 'Brasileirinho' tocado no cavaquinho, eu começo a chorar, rapaz", segue ele. "Se eu ouço Ernesto Nazareth tocando 'Odeon', voltando pro Brasil [de uma viagem], eu entro em descompasso de emoção", conta.

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    De seus 69 anos de vida e 53 de carreira, passou mais de 40 na TV Globo. Perdeu a conta de quantas novelas já fez. "Seguramente, acima de 45", afirma. A próxima é "Tempo de Amar", que estreia neste mês na faixa das 18h.

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    No intervalo das gravações da nova trama, assessoras da TV Globo dizem ao repórter João Carneiro que todos no Projac, o complexo de estúdios da emissora, dizem querer fazer uma camiseta com a frase "Eu amo o Tony Ramos". Ele ri ao saber da brincadeira. "Tô há muitos anos aqui dentro, né?"

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    E acredita que ficará ainda muito mais. "Eu ouço dizerem que a telenovela vai acabar desde a década de 1970. E ela chegou ao século 21. É evidente que vai mudar a forma de assistir. No futuro, prevejo novelas mais curtas, com até 120 episódios, ou com até 60 episódios, e estreando no streaming. Isso, sim, eu vejo".

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    "Sempre houve, para a telenovela, um olhar 'blasé' das chamadas elites brasileiras", afirma. Tony conta que, em 1983, quando o canal francês TF1 exibiu a novela "Baila Comigo", disse a um diretor da emissora, então pública, de forma "quase preconceituosa": "Que interessante vocês, de um país de tanta cultura, comprarem uma telenovela e a exibirem em horário nobre". Conta que o interlocutor respondeu: "Et pourquoi non?" (E por que não?)

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    Tony cuida da pronúncia de palavras estrangeiras, reproduzindo o sotaque nativo em francês, inglês ou espanhol. Em português, usa palavras e formulações como "calei-me" e "sobremaneira". Não diz que alguém é rico, mas, sim, "bem aquinhoado".

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    Ele não usa redes sociais, só compartilha o número de celular pessoal com os mais próximos e continua preferindo um bom livro a "dar um Google", que é "mais vazio que andar pro ar". "Eu me sirvo das modernidades quando necessário, mas não deixo que elas me escravizem", afirma.

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    "Sou antenado. Só que sou um homem que diz obrigado, por favor, que adora a língua portuguesa por achá-la linda. Sou aquele cara 'old fashioned way' [à moda antiga]. Eu vou abrir a porta pra uma mulher mesmo, vou me levantar pra minha mulher se ela for ao banheiro em um restaurante. Dane-se quem ache isso antiquado!"

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    "Ser polido, educado, respeitar os direitos de terceiros, opiniões, credos, raças e manifestações, quaisquer que sejam elas, desde que não invadam o terreno alheio, é ser bom-moço? Ou é um dever do cidadão?", pergunta ao repórter, que não responde. "A tua pausa me diz o que é a resposta. É um dever do cidadão. Então, eu sou bom-moço, se é pra ser bom-moço."

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    O ator viaja pelo país desde os anos 1970, quando se deslocava de avião monomotor para participar como paraninfo de bailes de debutantes no interior. "Era uma época muito interessante, muito particular. As meninas, e os papais também, sonhavam em se apresentar formalmente àquela sociedade. Não havia nenhuma estranheza nisso."

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    Lamenta algumas mudanças no Brasil. "Eu estudei em escola pública em São Paulo. Tinha latim, filosofia, espanhol, francês e inglês. Você ouviu bem o que eu estudava? Escola pú-bli-ca! Paulatinamente se foi tirando tudo isso".

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    Mas reconhece avanços. "Quantos tabus havia na minha época de jovenzinho! Eu prefiro os dias de hoje. Muito mais soltos, muito mais livres, as pessoas podem se manifestar." E segue: "[As pessoas] têm o direito de escolher seus caminhos, como querem ser. Obviamente, respeitando o próximo".

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    No ano que vem, o ator completa 70 anos. "Nunca preparei o momento dos 30, o dos 40. Não tive crise aos 50, nem aos 60. Você acha que eu vou me preparar pros 70? Eu não tenho esse nhe-nhe-nhem, sabe? Não tenho muito nhico-nhico, nheco-nheco, ai-ai-ai, ui-ui-ui, superstições, bater na madeira. Vida pra mim é família, minha companheira e trabalho." Ele é casado há 48 anos com Lidiane Barbosa.

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    "Eu sou muito grato por ser um artista popular", diz. "Nunca virei as costas para isso. Não me coloco num pedestal do homem erudito, de intelectual de ponta. Sei tudo, li tudo o que você puder imaginar e releio coisas. Mas não fico, com o perdão da boa expressão brasileira, cagando regras pra ninguém. Eu vivo a minha vida."

    mônica bergamo

    Jornalista, assina coluna com informações sobre diversas áreas, entre elas, política, moda e coluna social. Está na Folha desde abril de 1999. Escreve diariamente.

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