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    Nabil Bonduki

    Brasil e Venezuela, dois golpes contra a democracia

    08/08/2017 02h00

    Martin Mejia - 8.dez.2006/Associated Press
    ORG XMIT: 013101_1.tif O presidente venezuelano Hugo Chávez (à esquerda), da Venezuela, ao lado do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, durante a abertura da Cúpula da Comunidade Sul-Americana de Nações, em Cochabamba, na Bolívia. Venezuela President Hugo Chavez, left, talks with his Brazilan counterpart Luiz Inacio Lula da Silva as they attend the opening ceremony of the South American Summit, Friday, Dec. 8, 2006 in Cochabamba, Bolivia. Hopes for continent wide trading and a celebration of the region's populist movements will highlight a summit of South American leaders hosted by Bolivian President Evo Morales, whose own populist government faces deepening opposition. (AP Photo/Martin Mejia)
    Hugo Chávez e Lula durante a abertura da Cúpula da Comunidade Sul-Americana de Nações, na Bolívia

    A democracia representativa e parlamentar é um sistema imperfeito, mas ainda não se encontrou nada melhor. Garante liberdade de expressão, organização e manifestação; eleições livres; o direito de votar e ser votado; respeito aos resultados eleitorais.

    Os regimes autoritários alimentam-se da sua própria lógica de preservação. Suprimem, com violência, a liberdade de expressão e manifestação.

    O autoritarismo de direita mantém privilégios e concentração de renda. O de esquerda busca garantir direitos e distribuir riquezas. Mas ambos criam novos privilégios, obscurantismo e perseguição às minorias e aos direitos humanos.

    Com sinais trocados, o Brasil e a Venezuela sofreram golpes contra a democracia, com consequências nefastas.

    Herdeiros de políticas que melhoraram a vida dos pobres, os presidentes foram reeleitos, mas a oposição, ligada ao poder econômico, fez maioria no Legislativo. O mercado e as elites puseram milhares nas ruas e articularam, via Congresso, a derrubada dos presidentes.

    A semelhança para aí, mas a diferença é mais relevante.

    Na Venezuela, sob Chávez, a Constituição foi reformulada em 1999. Aprovou-se a reeleição do presidente e criaram-se mecanismos para controlar as Forças Armadas, o Judiciário e o Ministério Público.

    No Brasil, Lula foi republicano e respeitou a Constituição. Não topou mudá-la para se reeleger. Fortaleceu, com independência, o Judiciário, a PF e o Ministério Público.

    Maduro reprimiu manifestações com violência, restringiu a liberdade, prendeu opositores, esvaziou o poder do Legislativo e propôs uma Constituinte, escolhida em eleição contestada, para criar novas regras para o Estado.

    Dilma manteve a liberdade de expressão e o direito de manifestação. Respeitou a independência do Ministério Público e do Congresso, que atuou para enfraquecer o governo e aprofundar a crise econômica.

    Submeteu-se a um impeachment político, conduzido sem base legal por um presidente da Câmara chantagista e corrupto e articulado por uma coligação de forças políticas, empresariais, jurídicas e midiáticas, incluindo o vice-presidente.

    O golpe parlamentar desrespeitou as eleições, assumindo um mandatário sem votos, que implementa um programa oposto ao sufragado nas urnas. Denunciado pelo MPF, mantém-se usando recursos públicos. Um processo juridicamente frágil ameaça impedir o candidato mais forte de concorrer.

    Na Venezuela, o governo deu um autogolpe, destituindo o Congresso eleito. A democracia se foi, sob o argumento de manter conquistas sociais. No Brasil, ela está ameaçada em nome de reformas neoliberais que suprimem direitos.

    A defesa da democracia não pode ser instrumental. Sem ela, não há avanço social, direitos humanos nem liberdade.

    nabil bonduki

    Arquiteto e urbanista, é professor da FAU-USP. Em São Paulo, foi vereador, relator do Plano Diretor Estratégico e secretário municipal de Cultura. É autor de 12 livros.
    Escreve às terças-feiras.

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