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    Nabil Bonduki

    Facilitar o acesso a armas de fogo potencializa o risco de tragédia

    24/10/2017 02h00

    Em outubro, dois tiroteios ganharam visibilidade nos Estados Unidos, onde a posse de armas de fogo é quase liberada, e no Brasil, onde o Estatuto do Desarmamento (lei 10.826/2003) restringe seu acesso.

    Em Las Vegas, um bem-sucedido homem de 64 anos, pacato, aparentemente sem distúrbios, levou inúmeras armas e farta munição para um hotel, de onde disparou contra uma multidão. Matou 59 e feriu 529 pessoas, antes de se suicidar.

    Maior tragédia do gênero, é apenas um dos casos relatados pelo Gun Violence Archive, que registrou 11.621 mortes e 23.433 feridos por armas de fogo nos EUA em 2017.

    Em Goiânia, um adolescente disparou contra colegas em uma escola de classe média, usando a arma de seus pais, policiais militares, matando dois e feridos outros três, antes de ficar sem munição.

    Distúrbios psicológicos, violência na infância, bulliyng, revolta contra injustiças, depressão, homofobia, misoginia, busca de visibilidade. Causas que levam seres do sexo masculino ao desejo de matar em massa pessoas relacionadas (ou não) com seus problemas mentais.

    Deixo aos psicólogos analisar os distúrbios que provocam essas tragédias, praticadas por "homens de bem" (não falamos de terrorismo nem de crime organizado). Já o acesso aos instrumentos por eles utilizados é tema de política pública.

    No Congresso, tramitam vários projetos de lei que facilitam o acesso às armas de fogo, com o argumento de que os cidadãos precisam se defender dos bandidos. Mas o assunto interessa mesmo à indústria de armas e do medo.

    Segundo o PL 7282/2014, do deputado Jair Bolsonaro, "o cidadão tem direito à legítima defesa própria, de seus familiares e de seu patrimônio, (...) obrigando aos marginais pensarem duas vezes antes de cometerem seus crimes, já que encontrarão resistência (...) das pessoas de bem, dispostas a enfrentá-los".

    No entanto, segundo Ivan Marques, do Instituto Sou da Paz, "pesquisas mostram que quem reage armado tem 56% mais chances de ser vitimado, porque não tem tempo nem treinamento para reagir". Policiais treinados e com prática morrem mais em folga, quando reagem a um assalto. A presença de armas, em vez de repelir bandidos, atrai assaltos.

    Facilitar o acesso a armas de fogo aumenta o risco de seu uso fatal em momentos de tensão, como brigas familiares e de trânsito, ou sua manipulação equivocada, que gera mortes acidentais, verdadeiros dramas domésticos.

    Os episódios de Las Vegas e de Goiânia mostram como o acesso fácil a armas de fogo potencializa tragédias humanas. É claro que pessoas com distúrbios podem utilizar facas ou outras formas de agressão, mas apenas armas de fogo são capazes de gerar mortes em série e em massa. Por isso, seu controle é indispensável.

    nabil bonduki

    Arquiteto e urbanista, é professor da FAU-USP. Em São Paulo, foi vereador, relator do Plano Diretor Estratégico e secretário municipal de Cultura. É autor de 12 livros.
    Escreve às terças-feiras.

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