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    Natuza Nery

    Sem financiamento empresarial, campanhas de 2016 são mais modestas

    23/09/2016 02h43

    Campeã em desinteresse da população, esta eleição vai ser assim: quando você acordar, haverá um prefeito eleito.

    Neste ano, passamos longe dos efeitos especiais das propagandas de TV. Não há dinheiro de empresa (limpo, ao menos), não há bandeiras nas esquinas nem cavaletes poluindo as ruas.

    Os carros de som emudeceram. Santinho virou artigo raro —foi guardado para o dia da eleição para economizar.

    Já não há mais caixa para pagar militantes e, sem eles, ninguém mais ouve o burburinho das campanhas pela periferia.

    Os deuses reencarnados em marqueteiros se escafederam. Não há mais João Santana para operar milagres (milagre com muito dinheiro também não é lá tão sobrenatural, mas vale).

    Lula que o diga. Há quatro anos, o ex-presidente era praticamente o rosto mais estampado nos programas de TV Brasil afora. Nos filmetes do horário eleitoral, pedia voto para candidatos em quantidade quase fabril.

    Era comum locutores e candidatos venderem seu peixe ancorados "nos governos Lula e Dilma". Pegava bem dizer que o PT havia melhorado a sua vida "da porta para dentro", mas era preciso eleger alguém para cuidar de você "da porta para fora".

    Hoje o partido de Lula sustenta rejeições espantosas e o ex-presidente já quase não aparece em peças publicitárias.

    Em São Paulo, o ex-presidente não deu o ar da graça na região metropolitana denominada cinturão vermelho. Também não sabe como pode ajudar Fernando Haddad a sair do quarto lugar.

    Lula tem preferido subir nos palanques de cidades do Nordeste, reduto parcialmente imune aos desígnios da Lava Jato. Por lá, pesquisas mostram algo curioso, pragmático até. "Se ele fez coisa errada, eu não sei, só sei que ele dividiu dinheiro com a gente", afirmou um homem de baixa renda sobre os tempos de bonança da era Lula.

    Disse isso em uma sala de espelho —técnica usada para monitorar a opinião de eleitores e testar peças publicitárias sem que saibam que estão sendo acompanhados. A frase não tem valor científico, mas ajuda a compreender o que se passa na cabeça de alguns brasileiros.

    Mas Lula, apesar das dificuldades, não é o único padrinho político alijado da corrida municipal. Até mesmo aqueles ainda alheios à Lava Jato sofrem. Ou tomam chá de sumiço, ou aparecem em doses homeopáticas para não correr o risco de queimar o filme do afilhado.

    Se está dificílimo para os caciques, imagine para os postes?

    Falta dinheiro, falta popularidade, falta paciência do eleitor. Falta tanto que há campanhas desistindo de levar programas ao ar porque não há dinheiro para produzi-los. No interior de São Paulo, telas de TV ficam azuis entre uma apresentação e outra. Quando muito, candidatos repetem a mesma peça ao longo de toda a eleição. Por isso há tanto político defendendo o resgate do financiamento empresarial.

    As eleições de 2016 podem nos ensinar a fazer campanhas mais baratas —e, por causa disso, menos dolosas. Ou podem assustar tanto a classe política que o Congresso Nacional já já dará um jeito de mudar a legislação para que tudo volte a ser como 2014, 2012, 2010...

    natuza nery

    Escreveu até setembro de 2016

    Foi editora do Painel.

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