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    Nina Horta

    O enigma de Rita

    17/04/2015 02h00

    Prometi aos leitores assistir a todos os programas culinários da TV, começando com os da GNT.

    Segunda-feira, Rita Lobo. Sinto-me completamente à vontade para falar sobre ela. Muito cedo percebi que a Rita tinha o potencial de se tornar a nossa Martha Stewart, sem jamais se vestir de alaranjado.

    Tive certeza quando a vi fazendo uma reforma da cozinha, não sei se no YouTube ou no próprio site dela, em que ensinava a comprar pias mais fundas ou menos fundas, prestar atenção nas torneiras, no chão da cozinha, coisas assim que a gente está sempre precisando. Quem consegue segurar um programa de TV falando sobre profundidade de pias? Ela conseguia.

    Quem é Rita Lobo? Como diriam os americanos, Rita é uma "food person", alguém ligado à comida. Se a Rita quisesse e se empenhasse poderia se transformar em Martha, aquela máquina de fazer moda e dinheiro, sem dúvida.

    Martha era perfeita, esforçada, preocupada com a carreira e viria a se transformar numa marca. Formava opiniões. Rita, em versão tupiniquim, conseguiu o mesmo.

    No Brasil nunca é a mesma coisa, sempre menos gente para agradar. Loira, alta, bonita, inteligente e ainda por cima magra, com programa de rádio, blog, editora, seus próprios livros honestos.

    Na TV, tem uma cozinha bonita, limpa, onde não se vê um objeto velho e feio, ou um pano de prato esfiapado. Só panelas modernas, sobre superfícies de mármore e alumínio, louças coloridas, madeira e muita comida fresca espalhada. Toda a capacidade de Rita, enorme energia, segurança e autoconfiança estão à vista. Você olha e quer igual.

    E ela gosta do que faz. Não se despenteia, não se queixa, diverte-se à grande, leva sua vida, e você se sente capaz de imitá-la.

    Claro que isso provoca o consumo, mas é uma coisa feita delicadamente, sem agressividade. Queremos aquilo.

    Ela, a Rita, ensina o "faça você mesmo" com perfeição. Não escolheu ser a dona de casa tempo integral, nem caiu na armadilha de querer uma carreira que a afaste completamente do marido e dos filhos.

    Ela sabe, e todos seus fãs sabem, que tomar conta de uma casa é coisa que exige coração largo e muito trabalho.

    Sabe que a geração que a prestigia tem problemas com comidinha feita em casa. Sabe que ninguém quer e nem pode mais se identificar com panelas brilhantes e bolos de fubá mas, de repente...

    E que conciliar trabalho fora e dentro de casa é um enigma, que ela, Rita, consegue decifrar e passa adiante com graça.

    E, então, as mulheres, presas no trânsito, ansiosas, atrasadas, mil coisas por fazer, lembram-se dela, loira Rita, prática Rita, com suas tortas saídas do forno em minutos, e se animam. Afinal, é melhor amar a mulher perfeita que ela parece ser e tentar imitá-la do que nos queixarmos de nossas vidas difíceis.

    O programa é extremamente bem produzido. Coisa séria. A mi me gustaria um pouco mais de amor, de bobeira, de sensualidade com a comida, de paixão, de enlevo. Falta a "moleca", a mulher engraçada e espirituosa que é. Virá com o tempo. Nota 10.

    nina horta

    É escritora e colunista de gastronomia da Folha há 25 anos. É formada em Educação pela USP e dona do Buffet Ginger há 26 anos.
    Escreve às quartas-feiras.

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