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    Nina Horta

    Índios americanos fazem movimento para escapar de 'Colombização'

    29/11/2017 16h10

    Beth Galton e Charlotte Omnes/Divulgação
    Imagem do projeto "Cut Food", das americanas Beth Galton e Charlotte Omnes
    Imagem do projeto "Cut Food", das americanas Beth Galton e Charlotte Omnes

    Estava sem tempo para fazer a matéria e o meu amigo Cláudio Carvalhaes, que não pode ver uma minoria que já sai acorrendo a defender, enviou-me um artigo que aproveitarei inteirinho. Ele é teólogo e muito interessado em comida. Quando o conheci ele gostava que todas as suas pregações na igreja fossem acompanhadas por uma comilança compartilhada.

    Agora, ele me conta que os índios nativos americanos estão fazendo um movimento para escapar da "Colombização". Isto é, comidas depois de Colombo!

    Tudo começou com uma gafe daquelas: uma repórter convidando o índio ativista Karlos Bacca, que lida com pancs (plantas alimentícias não convencionais) e sementes em extinção, para dar uma receita de Thanksgiving, Dia de Graças para os americanos, e de desgraça para os índios. Receita ela não ganhou, mas três páginas ativistas contra os americanos que haviam dizimado os índios. E ainda uma resposta malcriada que para ele era hora de jejum.

    Mas já andam cedendo aos "foodies" e fizeram um jantar na James Beard Foundation, de sete pratos. Não se chamam de chefs, dizem que isso é coisa de francês e não querem saber de comida de moda —é, sim, um modo de vida. Muitos modos de vida, pois há 567 nações indígenas. Alguns cozinheiros indígenas mais famosos têm opiniões diferentes. Não gostam de ver quem não é índio cozinhando a comida deles e acham que é apropriação cultural. Outros nem se importam se o ingrediente for comprado deles, pois as reservas andam pobres e com muito desemprego. E além de tudo é preciso fazer certo, com técnica, por exemplo, não descascar a cenoura nem tirar a baba do cacto. Tá errado, tem que fazer direitinho e principalmente captar o espírito da coisa.

    Um dos indígenas, Sherman, começa seus jantares expondo toda a comida que será feita e explicando. Além de tudo reza e conta a história do banquete. Não entra em detalhes muito ofensivos, pois acha que é hora de compartilhar comida e não de ficar remoendo o passado.

    Serviu na casa James Beard um pernil de alce de panela e uma sobremesa de milho vermelho e maple e nem podia ficar com muito mimimi, pois cobrou US$ 175 o prato.

    Um grupo de indígenas está começando um movimento para a preservação de hábitos alimentares e se une a cientistas atrás de sementes de comidas em extinção, o que renderá algum dinheirinho e bolsa de estudos para as reservas cheias de desempregados.

    Acham, e com razão, que nada melhor para se entrar em contato com a cultura de um povo do que aprender sobre e comer a comida dele.

    Vamos todos nos estufar de perus, abóboras, "cranberries", arroz selvagem e broa de milho. E o que mais vier. E salmão! Pescam que é uma beleza!

    nina horta

    É escritora e colunista de gastronomia da Folha há 25 anos. É formada em Educação pela USP e dona do Buffet Ginger há 26 anos.
    Escreve às quartas-feiras.

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