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    Pasquale Cipro Neto

    O que é o 'P' de IPVA?

    DE SÃO PAULO

    20/02/2014 03h00

    No dia a dia, o caro leitor certamente vive às voltas com siglas e abreviaturas, muitas das quais se usam como verdadeiras palavras ou expressões incorporadas ao nosso léxico cotidiano. Quem de nós troca, por exemplo, a sigla CD (do inglês "compact disc") por "disco compacto"? Já pensou? Quem diria "Ouvi o último disco compacto de Caetano Veloso"?

    Quem não se interessa pela origem e pelo significado das siglas e abreviaturas usa com a maior tranquilidade do mundo "radar", "S.O.S", "laser", "HD", "HDL", "LDL", "Aids" e afins e toca a bola para a frente. Sem problemas, caro leitor. Afinal, como diria o filósofo, cada um, cada um. O arbítrio é livre, mas... Mas, se me permite, acho sempre melhor conhecer o significado das siglas, nem que isso aumente o sofrimento diante de determinados fatos...

    Antes de exemplificar o que acabei de dizer, vou matar a curiosidade dos que talvez queiram saber o significado de algumas das siglas e abreviaturas citadas no parágrafo anterior. Que diabo vêm a ser "HDL", "LDL"...? A fonte, como sói ocorrer, é o inglês. Nas duas siglas, as duas últimas letras representam "density lipoprotein", palavras que dispensam a tradução. O "H" de "HDL" vem de "high" ("alta", no caso); o "L" de "LDL" vem de "low" ("baixa").

    Moral da história: "HDL" significa "lipoproteína de alta densidade"; "LDL" é "lipoproteína de baixa densidade". Quando se sabe que o elemento grego "lipo" é "gordura", os puxões de orelha do cardiologista são sentidos com mais profundidade...

    Mas voltemos ao que afirmei no fim do segundo parágrafo deste texto ("...acho sempre melhor conhecer o significado das siglas, nem que isso aumente o sofrimento diante de determinados fatos..."). Talvez a dupla "HDL" e "LDL" já tenha servido para exemplificar o que eu quis dizer, mas há coisas piores. Um bom exemplo disso é a infeliz sigla "IPVA", que, como o leitor sabe, corresponde a... Sabe mesmo? O que é esse "P"? Bem, o "I" até os postes sabem que corresponde a "imposto". O "V" é de "veículos", e o "A" é de "automotores". E o "P"? E o bendito "P", santo Deus, ou melhor, santos secretários estaduais da Fazenda deste imenso Brasil?

    Pois bem. Esse "P" é de "propriedade". Então, se esse "P" é de "propriedade", por que é que muitas vezes se paga esse imposto pelo ano inteiro por ser e para ser proprietário por menos de um ano? No caso do Estado de São Paulo, onde vivo, o prazo se esgota em março. Então, permitam-me uma perguntinha burrinha, bem burrinha: se pago o imposto no primeiro trimestre e vendo o carro em abril...? Não preciso continuar, preciso?

    Será que ninguenzinho tem a brilhante ideia de mudar essa situação? Não me parece difícil. Lá vai o que suponho seja uma das possibilidades de estabelecer justiça nessa pândega: na transferência do veículo, o Estado devolveria ao vendedor o IPVA pago sobre os dias restantes do ano e cobraria esse mesmo valor do comprador. Aí sim o "P" de "IPVA" faria sentido. Que tal, senhores deputados estaduais? Atrevo-me a dizer que, se o sistema de cobrança não mudar, deve-se alterar a sigla. Que tal algo como "IAPASQTBMVA"? Traduzo: "Imposto Anual sobre a Propriedade Anual, Semestral, Quadrimestral, Trimestral, Bimestral ou Mensal de Veículos Automotores".

    Pois é, caro leitor. Na prática, nem sempre as siglas significam o que reduzem, abreviam etc. No Brasil, isso é só mais uma das tantas trapaças do nosso infame cotidiano. É isso.

    inculta@uol.com.br

    pasquale cipro neto

    Escreveu até dezembro de 2016

    Professor de português desde 1975, é colaborador da Folha desde 1989. É o idealizador do programa "Nossa Língua Portuguesa" e autor de obras didáticas e paradidáticas.

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