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    Patrícia Campos Mello

    Escalada da tensão Bolívia-Brasil

    17/05/2013 12h22

    Dia 28 de maio, o senador boliviano Roger Pinto vai completar um ano de asilo dentro da embaixada brasileira em La Paz. O governo de Evo Morales se recusa a dar salvo-conduto para o senador para que ele possa ir para o Brasil em segurança. A situação está bem longe de ser resolvida, segundo fontes envolvidas nas negociações.

    Não só isso, o governo de Evo Morales vem usando os corintianos presos na cidade de Oruro como moeda de troca. São 12 torcedores brasileiros que estão detidos há três meses acusados de matar o estudante Kevin Espada, de 14 anos. O governo brasileiro pede o relaxamento da prisão dos brasileiros, e permissão para cumprir prisão domiciliar.

    Comparemos a situação com a libertação do dissidente chinês cego Chen Guangcheng no ano passado. A negociação entrou para o currículo da secretária de Estado dos EUA Hillary Clinton como um dos pontos altos de sua gestão. Em pouco mais de um mês, Hillary conseguiu negociar com o governo chinês, que dificilmente pode ser chamado de um aliado, o salvo-conduto para Guangcheng.

    Já a Bolívia, suposta aliada do Brasil na Unasul, e que negocia adesão plena ao Mercosul, dá uma banana ao Brasil. Não seria caso de falar grosso com o governo de Evo Morales?

    O governo boliviano chegou a pedir a cabeça do embaixador Marcel Biato. Biato ganhou umas férias providenciais de um mês e meio e diante de pressões de parlamentares, voltou há pouco para a embaixada.

    Mas não se sabe quanto tempo vai ficar.

    A Unasul foi célere ao condenar a recusa do Reino Unido de dar salvo-conduto a Julian Assange, o fundador do Wikileaks asilado na embaixado do Equador em Londres. E quanto a Roger Pinto? Silêncio ensurdecedor.

    Roger Pinto fez denúncias contra o governo Evo, entre elas a suposta participação de ministros no tráfico de drogas. Ele é alvo de mais de 20 processos na Bolívia e diz que Evo usa a Justiça para persegui-lo.

    Os casos do senador e dos corintianos são os últimos capítulos de uma relação que vem azedando rapidamente. O governo Evo cancelou o contrato com a construtora OAS para construir uma estrada que cruzava um parque nacional e teve resistência de indígenas. A OAS não recebeu indenização e ainda ficou com o prejuízo de tudo o que já havia executado da obra.

    "Existe um problema de origem na relação do Brasil com a Bolívia, nós só cedemos, cedemos muito; quem muito se abaixa acaba mostrando o que não deve", diz o senador Ricardo Ferraço (PMDB-ES), presidente da Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional do Senado, que esteve no país tratando do caso dos corintianos e do senador de oposição. "Estamos acompanhando o grupo de trabalho (de negociação sobre o asilo do senador), mas as coisas não saem do lugar."

    Entre políticos de oposição e familiares, há cerca de 100 refugiados políticos bolivianos atualmente no Brasil, segundo uma fonte do governo. "Trata-se de um ponto de inflexão na região, são regimes progressistas que trouxeram melhoras sociais, mas isso não legitima o comportamento autoritário", diz a mesma fonte. "É o lado duro da liderança regional, requer que se digam as coisas desagradáveis também. Não dá para demonstrar só benevolência com os vizinhos."

    Mas a presidente Dilma, aparentemente, não quer comprar essa briga com Evo. E deixa o Itamaraty de mãos atadas.

    patrícia campos mello

    Repórter especial da Folha, foi correspondente nos EUA e escreve sobre política e economia internacional. Escreve às sextas-feiras.

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