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    Patrícia Campos Mello

    Dilma e a síndrome de Truman Show

    13/09/2013 03h00

    Um tipo de psicose batizado de "síndrome de Truman Show" está em alta nos Estados Unidos. O nome se refere ao filme de 1998, em que o ator Jim Carrey era , sem saber, personagem de um grande "reality show", vivendo em um palco, cercado por atores, com todos os movimentos filmados e assistidos por milhões de espectadores.

    Segundo reportagem da revista "New Yorker" desta semana, há um número crescente de pessoas internadas em hospitais psiquiátricos que sofrem dessa síndrome --acreditam que são "filmadas" e "assistidas" por milhares de pessoas, constantemente ouvem vozes de um "produtor" mandando fazer isso ou aquilo para ganhar o prêmio do show, creem piamente que têm todos os seus e-mails e telefonemas são monitorados, então ficam paranoicos em relação à privacidade de suas comunicações.

    A presidente Dilma Rousseff (que evita e-mails, e, quando recebe, os imprime) também vive seu pesadelo de Truman Show. Mas ela não está psicótica --ela realmente é espionada, pela NSA, a agência de segurança nacional dos EUA.

    Depois de a espionagem vir à tona em reportagens de Glenn Greenwald no "Globo" e no "Fantástico", EUA e Brasil tentam achar uma solução política para manter a visita oficial de Dilma a Washington em outubro. Dilma precisa de algum gesto substancial de desagravo de Obama para "salvar a face" e se justificar domesticamente.

    A nota de quarta-feira, emitida pela Casa Branca após reunião entre a conselheira de Segurança Nacional, Susan Rice, e o chanceler Luiz Alberto Figueiredo, definitivamente não resolve o assunto.

    Na nota, a Casa Branca se limita a dizer que o presidente americano "entende as preocupações levantadas pelo Brasil a respeito de certas atividades de inteligência supostamente realizadas pelos EUA". E promete uma "ampla revisão" das atividades de inteligência para garantir que são apropriadas. " --para depois afirmar que algumas das recentes revelações na imprensa "distorcem " as atividades da agência americana.

    Ontem, o subsecretário de Estado americano, William Burns, admitiu que a relação entre Brasil e Estados Unidos passa por dificuldades por causa das "revelações sobre a NSA (Agência de Segurança Nacional dos EUA)". Mas ele tratou da visita da presidente a Washington, que está em dúvida, como fato.

    Burns, que é vice do secretário de Estado, John Kerry, falou durante a cerimônia fechada de posse da nova embaixadora dos EUA no Brasil, Liliana Ayalde. Ayalde vem para o Brasil no domingo. Segundo a Folha apurou, Burns enfatizou a importância das relações bilaterais, mas reconheceu as dificuldades causadas pelo escândalo de espionagem da agência americana sobre a presidente Dilma, referindo-se explicitamente às "revelações sobre a NSA".

    Apesar de algumas vozes mais exaltadas, o governo brasileiro não gostaria de fazer um gesto de ruptura como cancelar a visita de Estado da presidente a Washington. Mas os EUA precisam descer do pedestal e se esforçar um pouco mais para produzir um fato político que permita a visita.

    patrícia campos mello

    Repórter especial da Folha, foi correspondente nos EUA e escreve sobre política e economia internacional. Escreve às sextas-feiras.

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