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    Patrícia Campos Mello - Patricia Toledo de Campos Mello

    A fome dos Maasai

    11/10/2013 15h10

    Vilarejo de Mkuru, norte da Tanzânia.

    Tajiri Asais tem onze anos, mas parece ter seis. Ele pesa 21 quilos e mede 1,26 metro. O peso e tamanho médio de um menino dessa idade são 34 quilos e 1,41 centímetros.

    Todos os dias, Tajiri anda uma hora para chegar até a escola. De café da manhã, ele toma só um chá preto, sem nada. As aulas vão das 07h30 às 14h30 --e ele não come nada, pois a escola não tem dinheiro para dar merenda, nem um mingau sequer.

    Ele chega em casa às 15h30 e come um ugali, um mingau de milho com água, sem proteína. Nos dias de sorte, tem também feijão.

    Tajiri é da tribo Maasai e mora no norte da Tanzânia.

    Os Maasai são duramente atingidos pela mudança climática. Com a seca prolongada, não conseguem mais se sustentar como pastores seminômades, como fizeram por séculos.

    Começaram a plantar milho também, mas com resultados ainda muito decepcionantes.

    Antes, os Maasai dedicavam-se somente a criar bodes, cabras e gado bovino. Alimentavam-se do leite e sangue dos bovinos, e, em dias de festa, matavam um bode.

    Com a seca, há cada vez menos gado, e o que sobrevive dá cada vez menos leite.

    Homens e meninos, às vezes, andam por dias para achar pasto para o gado.

    O Instituto Oikos, uma ONG italiana, trabalha com os Maasai da Tanzânia. Na escola do Mkuru, tentou de tudo. Ajudou os professores a fazer uma horta para que houvesse alguma merenda para os alunos. Mas a água não chegava, os professores compraram uma bomba de água que quebrou, eles não se dedicavam e a horta secou.

    "De estômago vazio, eles não conseguem aprender nada", diz Silvia Ceppi, do Oikos.

    Segundo o diretor da escola, as crianças dormem muito durante as aulas, porque estão famintas, e algumas desmaiam de fome.

    O instituto fez um estudo com as crianças das etnias Maasai, Meru e Arusha, presentes na região. Os mais atingidos pela desnutrição são os meninos de 11 a 17 anos.

    É uma tendência oposta à da Índia, onde as meninas é que são mais desnutridas. No sul da Ásia, meninas são "prejuízo" --os pais precisam pagar dote para casá-las.

    Já entre os Maasai, as meninas ganham dinheiro quando se casam, então são melhor alimentadas para "conservar o patrimônio".

    O Oikos montou um projeto para complementar a renda das mulheres --o Tanzania Maasai Women Arts. Em parceria com Istituto Europeo di Design, elas fazem versões modernas de suas tradicionais joias Maasai.

    O projeto se iniciou em 2006 e ia muito bem, mas as vendas caíram bastante com a crise europeia.

    A situação para o Oikos tampouco é fácil. O financiamento da União Europeia vem minguando.

    A jornalista é bolsista do International Reporting Project da Johns Hopkins University

    patrícia campos mello

    Repórter especial da Folha, foi correspondente nos EUA e escreve sobre política e economia internacional. Escreve às sextas-feiras.

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