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    Patrícia Campos Mello

    Acerto de contas com o Pinochet africano está próximo

    24/04/2015 09h20

    O Pinochet do Chade está prestes a enfrentar a Justiça, com 26 anos de atraso.

    Em 1982 Hisséne Habré assumiu o poder no Chade, este país africano que raramente recebe alguma menção em jornais. Ele ganhou apoio dos EUA e da França, que o consideravam um contraponto importante a Muammar Gaddafi, então ditador na Líbia.

    Nos oito anos que Habré permaneceu no poder, foram mortas 40 mil pessoas e torturadas 200 mil por motivos políticos.

    Ele foi derrubado em 1990 por um golpe de Estado de Idris Déby, que governa o país até hoje. E se asilou no Senegal, onde vive confortavelmente há mais de duas décadas.

    Em 2001, o advogado da Human Rights Watch Reed Brody esteve na sede da então polícia política do Chade e conseguiu recuperar milhares de documentos - entre interrogatórios, relatos de torturas, etc.
    Esses documentos possibilitaram abrir um processo contra Habré.

    O ditador chadiano era protegido pelo ex-presidente senegalês Abdoulaye Wade, que bloqueava todas as tentativas de processá-lo. Mas desde que Macky Sall assumiu a presidência no Senegal, em 2012, a sorte de Habré mudou.

    Foi criado um tribunal especial em Dacar, chamado de Câmaras Africanas Extraordinárias, que está cuidando do processo contra Habré desde junho de 2013. Foram 19 meses de investigação, com testemunho de 2.500 vítimas e exumação de cadáveres em valas comuns no Chade.

    Testemunhos das vítimas e relatos da Human Rights Watch mostram que Habré liderou um regime criminoso e sádico. Altos funcionários do governo acompanhavam torturas e interrogatórios por walkie-talkie. O método preferido de tortura era o "arbatachar" - o torturador amarrava os pés e as mãos da vítima nas costas, e a deixava nessa posição extremamente desconfortável por horas ou dias.

    Segundo a Human Rights Watch, as celas em que os prisioneiros eram mantidos eram tão pequenas e superlotadas que as pessoas tinham de ficar de pé. Para combater o calor, alguns dormiam sobre cadáveres até que fossem retirados.

    Ele é acusado de crimes contra a humanidade, crimes de guerra e tortura.

    O julgamento deve ocorrer nos próximos meses. Será a primeira vez na África que o tribunal de um país vai julgar o líder de outra nação.

    patrícia campos mello

    Repórter especial da Folha, foi correspondente nos EUA e escreve sobre política e economia internacional. Escreve às sextas-feiras.

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