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    Patrícia Campos Mello

    Use repelente e venha para a Olimpíada

    12/02/2016 02h00

    "Não deveria haver pânico. Não é como o ebola, as pessoas não morrem de zika."

    Assim falou o presidente americano Barack Obama em pronunciamento nesta semana. Ele citou a possível ligação entre o zika e má-formação em bebês, enfatizando a seriedade do problema. Mas a mensagem geral era: não há motivo para pânico.

    Obama veio a público para acalmar a população em meio a uma histeria generalizada nos Estados Unidos e outros países e ameaças de boicote à Olimpíada.

    Hope Solo, goleira da seleção de futebol dos EUA, disse que, se tivesse de decidir já, não iria para a Olimpíada no Rio.

    "Eu nunca correria o risco de ter um bebê que não fosse saudável. Eu não sei quando esse dia virá para mim e Jerramy (marido dela), mas eu me reservo o direito de ter um bebê saudável. Atletas mulheres não deveriam ser forçadas a tomar uma decisão que pode sacrificar a saúde de um bebê."

    Vale perguntar: mas que bebê? A não ser que ela esteja grávida ou planeje engravidar logo depois dos Jogos Olímpicos, não há risco.

    O remador britânico Andrew Triggs Hodge vai deixar a mulher em casa.

    Alan Marques/Folhapress
    Ministros se reúnem em Brasília para ação do governo federal no combate ao zika vírus, que deve começar no próximo final de semana
    Ministros se reúnem em Brasília para ação do governo federal no combate ao zika

    "Para qualquer um que queira formar uma família, o zika é uma ameaça real", disse a um jornal inglês.

    Segundo ele, há estudos indicando que mulheres infectadas pelo zika devem esperar dois anos antes de engravidar. (que estudo é esse, não sabemos; segundo o CDC, o vírus fica ativo só até uma semana após a infecção). "Não vale a pena pagar esse preço", disse, explicando por que a mulher não vai para o Rio.

    Pré-candidatos republicanos nos EUA chegaram a sugerir que pessoas vindo de áreas afetadas pelo zika ficassem em quarentena.

    Está certo, é um vírus novo e há inúmeras questões não respondidas.

    Eu, se estivesse grávida, também iria evitar regiões com alta incidência da doença. (Embora eu imagine que esse não é o caso da maioria das atletas que vêm para a Olimpíada).

    Admito que, mesmo não estando grávida, a possibilidade de o zika estar ligado à síndrome de Guillain Barré, que causa paralisia temporária, assusta.

    Mas é necessário pôr as coisas na devida proporção.

    Em 80% dos casos, o zika não causa nenhum sintoma. Quando há sintomas, são leves, normalmente se limitam a uma gripe, dores nas articulações e uma erupção na pele.

    Vamos pensar no seguinte: em 2015 (entre 04/01/2015 e 02/01/2016), foram 1,6 milhão de casos de dengue no Brasil, com 863 mortes.

    Por ano, 500 milhões de pessoas pegam malária no mundo, e 2,7 milhões morrem, segundo a Organização Mundial da Saúde.

    Como disse o diretor médico da delegação australiana, a poluição da baía de Guanabara é uma ameaça bem maior do que o zika para os atletas.

    "Pegar uma infecção intestinal, com vômitos e diarreia, não é exatamente ideal para quem está competindo na Olimpíada", disse à Associated Press.

    Ou seja, a não ser que você esteja grávida, venha para a Olimpíada, use repelente, e que vença o melhor.

    De novo, precisamos de proporção: a real tragédia é a vivida pelas dezenas ou centenas de mães, na maioria muito pobres, que tiveram bebês com problemas graves, provavelmente por causa do zika.

    patrícia campos mello

    Repórter especial da Folha, foi correspondente nos EUA e escreve sobre política e economia internacional. Escreve às sextas-feiras.

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