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    Paula Cesarino Costa - Ombudsman

    O lado da Folha na Previdência

    20/11/2016 02h00

    O gasto previdenciário no Brasil não para de crescer. A população está cada vez mais velha. A existência de aposentadorias especiais e o acúmulo de benefícios são insustentáveis. Há tempos muitos especialistas reclamam uma solução.

    A reforma da Previdência é um dos temas que alarmam o cidadão e geram críticas de leitores, muitas das quais de caráter pessoal ou corporativo, por isso mais quentes do que arrazoados político-econômicos sobre números frios e sem vida.

    Apesar de discordâncias sobre a situação real das contas previdenciárias e sobre como se chegou ao cenário atual, a existência de necessidade de mudanças urgentes parece ser a opinião majoritária.

    A dúvida se estabelece quando entra em discussão o que fazer. Reforma de que tipo, em que medida, em que pontos? É quando a divergência se amplifica.

    O governo Michel Temer prometeu enviar ao Congresso uma proposta de reforma até o final do ano. Por mexer no bolso e afetar a vida de todos, é o caso que cutuca o passado e espreita o futuro.

    De modo geral, na avaliação dos leitores a cobertura da Folha é incompleta, parcial e pouco analítica em relação às propostas preliminarmente apresentadas pelo governo.

    Eles apontam que o jornal não tem sido plural no seu enfoque, esquecendo-se especialmente de dar voz aos sindicatos dos trabalhadores da iniciativa privada e às associações dos servidores públicos.

    "O jornal investe numa série de reportagens para aprofundar a discussão sobre a Previdência e as propostas do governo", diz o editor de "Mercado", Ricardo Balthazar.

    Duas reportagens em especial, que se tornaram manchetes da Folha, provocaram reações extremadas.

    A primeira, de 11 de setembro, afirmava: "Sem reforma da Previdência, país deve empobrecer". Na crítica interna, comentei que a manchete estava no limite da editorialização. Sem novidade factual, o texto tinha caráter analítico pouco comum. Abriu mão da reportagem no seu sentido mais amplo.

    O leitor Leonardo Barlach afirmou que a reportagem "cita como fato uma bomba, sem apresentar nenhum tipo de estudo acadêmico, relatório de órgão governamental ou internacional, ou qualquer outro estudo relevante" e ouviu um único especialista. "Em tempo de jornalismo que busca explicar melhor as notícias e embasá-las em estatísticas, é triste ver a Folha se importar tão pouco em estimular o debate."

    A outra, publicada em 24 de outubro, dizia o seguinte: "Aposentado do INSS custa 1/3 do servidor federal". A reação foi em grande medida de servidores públicos. O leitor Caetano Brugnaro assumiu o "interesse pessoal" e perguntou: "Por que a Folha nunca publica algumas informações que ajudariam a formar um retrato melhor da situação previdenciária, sem demonizar o servidor público aposentado?".

    Não seria justo dizer que o jornal tem menosprezado o tema. Há inúmeras reportagens publicadas, como lembra a Secretaria de Redação, que tratam desde a discussão sobre o uso que o governo fez de contribuições destinadas pela Constituição ao financiamento da Seguridade Social até as propostas apresentadas pelas centrais sindicais.

    "Algumas das questões levantadas pelos leitores já foram abordadas e pretendemos revisitar vários temas. O assunto é vasto e muito complexo. Temos feito esforços para esclarecer vários pontos que têm gerado controvérsia entre leitores e na sociedade", afirma Balthazar.

    A dificuldade do tema faz com que alguns leitores vejam erro naquilo que na realidade é uma interpretação possível, mas não única ou consensual. O problema é que muitas das reportagens não refletem essa complexidade, verbalizando ideias de apenas um grupo.

    A cobertura a conta-gotas, na qual temas são tratados espaçadamente, induz a visão fragmentária.

    Se o espaço disponível na versão impressa não permite abordar todos os aspectos importantes nem contemplar sempre todas as correntes de opinião, o jornal precisa investir pesado na cobertura digital.

    As reportagens sobre o assunto estão reunidas neste endereço. Mas é pouco. Não há um ambiente especial multimídia moderno, atraente e acessível, que reúna de forma editorialmente inteligente tudo o que a Folha publicou sobre a reforma da Previdência, sejam reportagens, artigos de opinião, entrevistas ou infográficos.

    O jornal deveria criar espaço próprio para discussão, no impresso e no digital, recalibrar a pluralidade de abordagens, buscar revelações relevantes e contar histórias humanas de um tema que não pode se limitar à chatice de relatórios.

    O jornal tem de ter lado na cobertura da reforma da Previdência. O lado dos leitores, no sentido de detectar suas aspirações, esclarecer suas dúvidas e amplificar as vozes do debate para que formem qualificadamente a sua opinião.

    paula cesarino costa

    Está na Folha desde 1987. Foi Secretária de Redação e editora de Política, Negócios e Especiais. Chefiou a Sucursal do Rio até janeiro de 2016. Escreve aos domingos.

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