• Colunistas

    Monday, 06-May-2024 07:05:40 -03
    Paula Cesarino Costa - Ombudsman

    Poucos comentários sobre julgamento do TSE mostram desafio para as eleições

    11/06/2017 02h00

    Carvall/Folhapress
    ilustra coluna ombu

    A decisão do Tribunal Superior Eleitoral de não cassar a chapa Dilma Rousseff-Michel Temer, apelando a tecnicalidades duvidosas para não reconhecer o abuso do poder econômico no pleito de 2014, expõe a resiliência das estruturas de poder viciadas do sistema político brasileiro.

    Entre leitores, usuários de redes sociais, jornalistas e comentaristas políticos, as manifestações em favor da decisão dos ministros do TSE foram mínimas. Até a manhã de sábado, as que contei não somavam os dedos de uma das mãos.

    Os que contestaram o resultado expressaram sentimentos de indignação misturados a galhofas -"foi o primeiro caso de absolvição por excesso de provas", ironizou um.

    O leitor do jornal não se pode dizer surpreso com o resultado do TSE. Desde o fim dos mandatos de dois ministros desse tribunal, os jornais publicaram repetidas vezes a estratégia do presidente Michel Temer de escolher nomes de sua confiança, que "matassem no peito", na já célebre expressão brasiliense, a reação da opinião pública à manutenção de seu mandato.

    Na edição impressa do sábado (10), a Folha publicou manchete que buscou ir além do registro do resultado: "Gilmar desempata e TSE absolve Michel Temer por quatro a três". "O Estado de S. Paulo" seguiu na mesma linha: "TSE mantém Temer na Presidência por 4 votos a 3". "O Globo" foi mais interpretativo: "TSE ignorou provas".

    Exauridos pelo excesso de horas de transmissão e cobertura ao vivo pela TV e pelos sites, leitores pouco se manifestaram sobre a cobertura jornalística. Concentraram-se em comentar o resultado.

    A cobertura da Folha não se destacou. O tempo era curto, reconheço, mas a edição não conseguiu fazer um resumo de qualidade dos pontos principais dos votos dos ministros. Era esse o requisito essencial, a ser calibrado com análise e bastidores, para ajudar o leitor a formar opinião própria.

    O julgamento está superado, mas não a crise política. O presidente da República deve ser denunciado pelo Ministério Público, talvez enfrentando a acusação de chefe de quadrilha criminosa. Em meio ao descrédito de tantas instituições, caberá à imprensa fazer valer seu papel de agente fiscalizador.

    No lado institucional, a história cobrará dos ministros aquilo que o relator do processo chamou de "cegueira deliberada". No lado jornalístico, que lição pode tirar a imprensa do processo, dos elementos de corrupção levantados e do resultado?

    Quem abrir linhas independentes e vigorosas de investigação terá mais chance de mostrar-se essencial para seus leitores.

    Uma das coisas que lamento é perceber o papel lateral que as investigações jornalísticas tiveram tanto no processo do TSE como na maioria dos processos da Operação Lava Jato. Mais do que reflexo de instituições, o jornalismo precisa ter motor próprio.

    A cobertura da eleição de 2018 desde já se levanta como um desafio imenso para os jornalistas. Depois de tudo o que foi apurado a respeito dos subterrâneos das campanhas, será difícil aceitar que predomine cobertura meramente declaratória, sem esforços estruturais, financeiros e investigativos para esquadrinhar candidatos e partidos.

    Em meio à crise, os jornais têm à frente de si oportunidades, sim, mas também responsabilidades.

    OMBUDSMANS DA OMBUDSMAN

    Na semana passada, ao comentar a surpreendente e equivocada decisão do jornal "The New York Times" de acabar com o cargo de ombudsman, corroborei leitor que afirmou: "A maioria dos leitores é 'achista'. Achismo é bem diferente de jornalismo".

    Recebi críticas. O leitor Flávio Fonseca viu "arrogância e prepotência da classe que se acha a senhora da razão e detentora absoluta do conhecimento universal".

    O leitor Sergio Holl Lara argumentou que "existem achistas e não achistas" e que entre os leitores há pessoas com formação e experiência que darão opiniões abalizadas, com as quais se poderá concordar ou não.

    Peço desculpas aos que se ofenderam. Vale explicar. As opiniões do leitor são fundamentais e base do trabalho de seu representante. Há muitos tipos de leitor, diferentes opiniões. Nem melhores nem piores. Cabe ao ombudsman ouvi-las, entendê-las e passá-las para a Redação. Nem leitores podem ser a única voz a ser ouvida, nem o ombudsman pode desprezá-los.

    Repito que a função fortalece o leitor e facilita o diálogo com a Redação -e a cobrança.

    É mais necessário do que nunca ouvir a voz dos leitores. O ambiente de mudança exige que a função se renove e se qualifique.

    Por isso, agradeço que os leitores sejam também ombudsmans da ombudsman.

    paula cesarino costa

    Está na Folha desde 1987. Foi Secretária de Redação e editora de Política, Negócios e Especiais. Chefiou a Sucursal do Rio até janeiro de 2016. Escreve aos domingos.

    Edição impressa

    Fale com a Redação - leitor@grupofolha.com.br

    Problemas no aplicativo? - novasplataformas@grupofolha.com.br

    Publicidade

    Folha de S.Paulo 2024