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    Paula Cesarino Costa - Ombudsman

    Novos comportamentos alteram o pessimismo sobre o futuro da notícia

    23/07/2017 02h00

    Alguns lances recentes no xadrez da comunicação mundial indicam que o jogo, às vezes nada parelho, entre as empresas de mídia e os gigantes das redes sociais pode sofrer uma reviravolta.

    Nos Estados Unidos, uma entidade que reúne 2.000 publicações, liderada pelos jornais "The New York Times", "The Wall Street Journal" e "The Washington Post", quer negociar coletivamente com Google e Facebook formas de remuneração por seus serviços. Os dois gigantes digitais têm se mobilizado na proposição de parcerias, de modo a possibilitar a cobrança por informação.

    Pesquisas recentes mostram que, em alguns países desenvolvidos, há tendência de saturação do uso de redes sociais para obter notícias. Desponta como novidade a intenção de jovens consumidores de pagar por informação de qualidade.

    Carvall/Folhapress
    Ilustração para a coluna da Ombudsman - 23/07/2017

    O quadro mundial sofre mudanças lentas, mas que parecem alvissareiras para quem acredita no bom jornalismo como ferramenta essencial para os cidadãos.

    A velocidade das transformações causadas pela internet no comportamento do público-leitor e as crises econômicas globais derrubaram o volume de publicidade e abalaram as receitas das empresas de mídia em todo o planeta. A disputa pelo tempo do leitor passou a ser vital.

    Redes sociais, como Facebook e Twitter, cresceram de modo vertiginoso, ocupando cada vez mais o tempo das pessoas com ofertas diversas. O Google dominou as ferramentas de busca por informações, beneficiando-se de conteúdo produzido por outras empresas.

    O desenvolvimento do chamado paywall, em que o leitor paga depois de um determinado número de textos acessados, abriu nova forma de financiamento do jornalismo. Recebeu adesão de jornais do mundo todo.

    Se as assinaturas das versões impressas seguem em queda, os assinantes digitais crescem e permitem vislumbrar cenários melhores, em que a receita publicitária deixará de ser preponderante para os jornais.

    Os leitores exclusivos do site do "New York Times" já ultrapassaram 2 milhões. No "Financial Times", a receita com assinaturas digitais superou a de assinaturas do jornal em papel.

    No caso da Folha, o número de assinantes digitais já é superior ao dos que assinam a versão impressa. Cresce a importância das redes sociais na audiência dos sites jornalísticos brasileiros, principalmente do que o meio chama de "dark social" —audiência cuja origem exata é difícil de precisar, como links compartilhados por meio do WhatsApp ou enviados por e-mail e mensagens de texto.

    É um mundo ainda a ser descoberto. Estudo do Instituto Reuters, recém-divulgado, aponta como uma das novidades o aumento da propensão do leitor a pagar por notícia on-line.

    Apesar de persistir a relutância em pagar por informação — 84% não pagaram no último ano-, nos EUA os pagantes passaram de 9% em 2016 para 16% em 2017, mercado impulsionado pela eleição presidencial.

    A maioria desses novos leitores pagantes são jovens, o que desfaz a impressão de que formam um segmento não disposto a desembolsar por notícia de qualidade. Também se destacam os que tem posição ideológica de esquerda.

    A questão da confiança é fundamental na justificativa dos que pagam por notícia. Apenas um quarto dos entrevistados acredita que as redes sociais são eficientes na separação do fato da ficção. Em comparação, 40% acham que isso é corretamente feito pelos meios de comunicação dito tradicionais.

    Os dados, que abrangem 36 países e cinco continentes, com base em 70 mil entrevistas, ainda têm indicativos preocupantes. Apontam redução significativa do leitor de jornais, com predomínio da televisão e da informação on-line. Em todos os países, os mais jovens são mais propensos a usar redes sociais e a ter a mídia digital como sua principal fonte de notícias.

    Nesse cenário, o Brasil, apesar de um dos menores índices de penetração da internet (68%), tem o segundo maior índice de confiança nas notícias (60%) e é o segundo com mais pagantes por notícias on line (22%), atrás da Noruega.

    O jogo está em andamento, mas já é possível inferir que o leitor valoriza a notícia de qualidade. Como notou um grande enxadrista, a vitória é sempre obtida a partir de pequenas vantagens. Assim, o bom jornalismo, nas pequenas vitórias aqui reunidas, parece encontrar chances reais de sobrevivência.

    paula cesarino costa

    Está na Folha desde 1987. Foi Secretária de Redação e editora de Política, Negócios e Especiais. Chefiou a Sucursal do Rio até janeiro de 2016. Escreve aos domingos.

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