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    Paul Krugman

    Uma nação na contramão

    25/08/2014 12h36

    O governador Rick Perry, do Texas, está disputando a presidência de novo. Quais são suas chances? Será que ele uma vez mais se tornará motivo de piada? Não faço ideia. Esta não é uma coluna de turfe.

    O que eu gostaria de fazer, em lugar disso, é aproveitar as ambições de Perry para falar sobre um dos meus assuntos favoritos: as diferenças de crescimento econômico e populacional entre as diferentes regiões.

    Pois o fato é que, embora a postura linha dura e a religiosidade de Perry possam funcionar bem junto à base do Partido Republicano, seu apelo nacional, se é que existe, terá de depender das alegações de que ele sabe como criar prosperidade. E é verdade que o Texas registrou crescimento de emprego superior ao do restante do país. O mesmo vale para outros Estados sulistas governados por conservadores. A questão, porém, é descobrir por quê.

    A resposta da direita, evidentemente, é a de que tudo depende de evitar regulamentação que interferia com os negócios e de manter baixos os impostos pagos pelos ricos, o que encorajaria os criadores de empregos a criá-los. Mas na verdade existem grandes problemas nessa história, mesmo desconsiderado o hábito dos economistas que defendem essa linha de argumentação de operar com fatos incorretos.

    Para que vejamos os problemas, é preciso contar a história de três cidades.

    Uma dessas cidades é o lugar que as pessoas que vivem em sua órbita, como eu, tendem a chamar de "a cidade". E, hoje em dia, Nova York está se saindo bem em diversas frentes. Mas a despeito do influxo de imigrantes e hipsters, pessoas suficientes estão saindo da Grande Nova York - área que se estende à Pensilvânia, de um lado, e a Connecticut, do outro - para que sua população tenha caído em 5% entre 2000 e 2012. Ao longo do mesmo período, a população de Atlanta cresceu em quase 27% e a da Grande Houston cresceu em quase 30%. O centro de gravidade dos Estados Unidos está se movimentando para o sul e para o oeste. Mas por quê?

    Seria, como afirmam Perry e outros, porque as políticas simpáticas aos negócios e aos ricos que ele favorece significam oportunidade para todos? Se fosse esse o caso, seria de espertar que todas essas oportunidades de emprego gerassem aumento de salários no sul, para atrair pessoas dos moribundos Estados industriais do norte.

    Mas na realidade os salários dos locais dos Estados Unidos que atraem mais migrantes são tipicamente mais baixos do que nos lugares dos quais esses migrantes provêm, sugerindo que os lugares que os norte-americanos estão deixando apresentam maior produtividade e mais oportunidades de emprego do que os lugares para os quais estão indo. O emprego médio na Grande Houston paga 12% menos do que o emprego médio na Grande Nova York; o emprego médio na Grande Atlanta paga 22% menos.

    Assim, por que as pessoas estariam se mudando para essas áreas de baixo salário? Porque viver nelas é mais barato, principalmente por conta do custo da habitação. De acordo com o Serviço de Análise Econômica do governo federal dos Estados Unidos, os aluguéis (ou o custo de pagamento de prestação da casa própria) na região metropolitana de Nova York são cerca de 60% mais altos do que em Houston, e 70% mais altos do que em Atlanta.

    Em outras palavras, o que os fatos realmente sugerem é que os norte-americanos estão sendo forçados a sair da região nordeste (e, mais recentemente, da Califórnia) pelos custos elevados da habitação, e não por estarem sendo atraídos pelo desempenho econômico superior do sul.

    Mas por que os preços da habitação em Nova York e na Califórnia são tão altos? A densidade populacional e a geografia são parte da resposta. Por exemplo, Los Angeles, a pioneira na expansão urbana por vastas áreas agora vista também em Atlanta, não dispõe mais de áreas desocupadas e se tornou uma metrópole surpreendentemente densa. Mas como enfatizam Edward Glaeser, de Harvard, e outros pesquisadores, os altos preços da habitação nos Estados de crescimento lento também devem muito a políticas que limitam severamente as novas construções. Limites à altura de edificações nas cidades, zoneamento que proíbe concentração mais densa de população nos subúrbios e outras políticas restringem a oferta de habitação, nas duas costas; enquanto isso, a regulamentação mais frouxa no sul manteve o suprimento de moradias elástico e o custo de vida baixo.

    Assim, as queixas dos conservadores sobre regulamentação excessiva e governos intrusivos não estão inteiramente erradas, mas o segredo do crescimento do sul não está em ser gentil para com as grandes empresas e o 1%; está, sim, em não atrapalhar o suprimento de moradias à classe média e à classe trabalhadora.

    E isso, por sua vez, significa que o crescimento do sul não é o tipo de história de sucesso que os conservadores gostariam de nos fazer aceitar. Sim, os norte-americanos estão se mudando para lugares como o Texas, mas em um sentido fundamental estão se mudando na direção errada, deixando economias nas quais sua produtividade é alta por outras nas quais ela é mais baixa. E a forma de tornar o país mais rico é encorajar as pessoas a se mudarem de volta, tornando mais acessível o custo da habitação nas áreas metropolitanas de alta densidade populacional e altos salários.

    Assim, Rick Perry não sabe o segredo de criar empregos, e nem mesmo como promover o crescimento regional. Seria ótimo ver a verdadeira chave - habitação a preço acessível - se tornando uma questão nacional. Mas não acredito que os democratas estejam dispostos a indicar o prefeito Bill de Blasio, de Nova York, como candidato à presidência - ao menos não ainda.

    Tradução de PAULO MIGLIACCI

    paul krugman

    Prêmio Nobel de Economia (2008), é um dos mais renomados economistas da atualidade. É autor ou editor de 20 livros e tem mais de 200 artigos científicos publicados. Escreve às terças e sábados.

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