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    Paul Krugman

    A reforma da saúde vive nos Estados Unidos!

    23/11/2015 12h17

    Jewel Samad/Associated Press
    (FILES) Cathey Park shows her arm in a cast on which "I love Obamacare" is written as she waits to hear US President Barack Obama speak on healtcare at the Faneuil Hall in Boston, Massachusetts, in this October 30, 2013, file photo. Only 100,000 people have enrolled in the new US Obamacare health plan so far, and fewer than 27,000 have made it through a faulty federal sign-up website, the government said November, 13, 2013. The figure of 106,185 registrations represents only 1.5 percent of the estimated total sign up for the plan by the end of the enrollment period in March, the Health and Human Services Department said. AFP Photo/Jewel Samad/FILES ORG XMIT: J675
    Cathey Park exibe braço engessado em que se lê "Eu amo Obamacare" antes de discurso do presidente

    Para consternação da direita, as táticas de intimidação —lembra-se dos "painéis da morte"?— e os desafios jurídicos espúrios falharam em proteger a nação do flagelo da garantia da cobertura de saúde. Ainda assim, os oponentes do Obamacare insistiam que o programa iria implodir em uma "espiral da morte" com baixo número de cadastros e custos crescentes.

    Mas os primeiros dois anos da implementação completa da lei foram notavelmente bons. O número de americanos não segurados caiu drasticamente, praticamente em linha com as projeções, enquanto os custos ficaram bem abaixo das expectativas.

    Os opositores da reforma poderiam ter reconsiderado sua posição —mas isso quase nunca acontece na política moderna. Em vez disso, eles dobraram a aposta em suas previsões de desgraça e tornaram sensacionalista cada indício de más notícias.

    Menciono tudo isso para dar uma perspectiva sobre acontecimentos recentes que marcam uma pausa na sequência de surpresas positivas. Sim, o Obamacare teve um período difícil recentemente. Mas ele foi muito menos significativo do que muitas reportagens —sem falar da a reação da direita— querem fazer crer. A reforma da saúde ainda é uma enorme história de sucesso.

    O Obamacare visa cobrir os não segurados por meio de dois canais. Os americanos de baixa renda são cobertos por uma expansão financiada em nível federal do Medicaid, que deveria ser de âmbito nacional. Mas foi rejeitado em muitos Estados controlados pelos republicanos. Todo o resto das pessoas tem acesso a apólices vendidas pelas seguradoras privadas que não podem discriminar o cliente com base na história clínica; essas apólices devem ser acessíveis pelos subsídios, que dependem da renda.

    Ninguém nunca esperou que o Obamacare cobrisse todos os não segurados. Na verdade, as projeções Escritório de Orçamento do Congresso feitas em 2013 sugeriram que cerca de 10% dos residentes americanos não idosos permaneceriam descobertos: alguns porque são imigrantes ilegais, alguns por causa da lacuna criada pela rejeição ao Medicaid pelos Estados republicanos e alguns porque seriam esquecidos por um sistema complicado. Mas a lei, no entanto, foi projetada para produzir uma redução acentuada no número de americanos sem seguro e conseguiu, especialmente em Estados como a Califórnia, que tentaram fazê-la funcionar.

    Enquanto isso, ambos os prêmios de seguro e os custos de subsídios destinados a torná-los acessíveis foram muito abaixo das expectativas, tanto em 2014 quanto em 2015.

    Mais cedo ou mais tarde, é claro, era provável que houvesse algumas surpresas negativas. E nós estamos agora, finalmente, recebendo algumas más, ou pelo menos não muito boas, notícias sobre a reforma da saúde.

    Em primeiro lugar, os prêmios estão subindo para o ano que vem, porque as seguradoras estão descobrindo que seu pool de risco é um pouco pior e, portanto, mais caro do que eles esperavam. Há muita variação entre os Estados, mas o aumento médio será de cerca de 11%. Essa é uma ligeira decepção, mas não é chocante, dada a boa notícia dos dois anos anteriores e a tendência a longo prazo de prêmios de seguro a subir de 5% a 10% em um ano.

    Em segundo lugar, alguns americanos que compraram planos de baixo custo foram desagradavelmente surpreendidos por altas franquias. Este é um problema real, mas não deve ser exagerado. Todos os planos autorizados cobram serviços preventivos sem franquia, e muitos planos cobrem outros serviços de saúde também. Além disso, a ajuda financeira adicional está disponível para famílias de baixa renda para ajudar a cobrir essas lacunas. Algumas pessoas podem não saber desses fatores atenuantes —esse é o problema de um sistema bastante complexo— mas o conhecimento deve melhorar ao longo do tempo.

    Finalmente, o UnitedHealth Group fez um alarde ao anunciar que está perdendo dinheiro com as apólices que vende por meio do Obamacare e está considerando sua retirada do mercado no ano que vem. Havia algumas coisas intrigantes no anúncio, levando à especulação sobre segundas intenções, mas o principal a se perceber é que o UnitedHealth, enquanto um grande provedor de seguros com uma base de empregados, é na verdade um player relativamente pequeno neste mercado, e que os outros players soam muito mais positivos.

    Ah, e as projeções oficiais dizem agora que menos pessoas vão trocar seus planos (de empregados) pelo Obamacare do que o previsto anteriormente. Mas a razão principal é que, surpreendentemente, poucos empregadores estão reduzindo a cobertura; projeções totais para o número de americanos sem seguro ainda parecem muito boas.

    Então, em que ponto isso nos deixa? Sem dúvida, a corrida de boas notícias inesperadas sobre o Obamacare chegou ao fim, como sempre acontece. E, olha, estamos falando de um sistema completamente novo com o qual todo mundo ainda está aprendendo a lidar. Era provável que houvesse alguns nós ao longo do caminho.

    Mas será que estamos olhando para o início de uma espiral da morte? Algumas pessoas estão realmente dizendo isso, mas que eu saiba são pessoas que têm previsto desastres a cada passo do caminho e ainda estarão prevendo um colapso iminente daqui a uma década.
    A realidade é que o Obamacare é um sistema imperfeito, mas é viável – e está funcionando.


    Tradução de MARIA PAULA AUTRAN

    paul krugman

    Prêmio Nobel de Economia (2008), é um dos mais renomados economistas da atualidade. É autor ou editor de 20 livros e tem mais de 200 artigos científicos publicados. Escreve às terças e sábados.

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