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    Paul Krugman

    Eleitor deve pensar seriamente sobre o que deseja que aconteça nos EUA

    19/09/2016 09h52

    Jim Young/Reuters
    Imagens decorativas dos candidatos democrata, Hillary Clinton, e do republicano, Donald Trump
    Imagens decorativas dos candidatos democrata, Hillary Clinton, e do republicano, Donald Trump

    Faz sentido votar em Gary Johnson, o candidato libertário à presidência dos Estados Unidos? Com certeza, desde que você acredite em duas coisas. Primeiro, você tem de acreditar que não faz diferença alguma que Hillary Clinton ou Donald Trump chegue à Casa Branca —porque um deles o fará.

    Segundo, você precisa acreditar que os Estados Unidos se sairão melhor em longo prazo se eliminarmos a regulamentação ambiental, abolirmos o imposto de renda, pusermos fim às escolas públicas e desmantelarmos a Previdência Social e o programa federal de saúde Medicare —que é o que a plataforma dos libertários defende.

    Mas será que 29% dos eleitores norte-americanos entre os 18 e os 34 anos de idade realmente acreditam nessas coisas? Duvido. No entanto, de acordo com uma recente pesquisa da Quinnipiac, é essa a proporção dos eleitores da geração milênio que dizem que votariam em Johnson se a eleição acontecesse hoje.

    E a preponderância entre os norte-americanos jovens que dizem que apoiarão Johnson ou Jill Stein, a candidata do Partido Verde, parece vir de eleitores que apoiariam Hillary em uma disputa com apenas dois candidatos; incluir os candidatos de partidos menores reduz a margem de liderança dela entre os eleitores jovens de 21 pontos percentuais para apenas cinco.

    Por isso, eu gostaria de fazer um apelo aos jovens norte-americanos: o voto de vocês importa; por favor, encarem a eleição com seriedade.

    Por que os candidatos menores parecem estar atraindo tanto apoio este ano? Muito pouco desse apoio pode ser explicado com base em adesão às suas propostas políticas. Quantas pessoas de fato leram a plataforma dos libertários? Mas se você está pensando em votar em Johnson, deveria realmente fazê-lo. É um documento notável.

    Como eu disse, ela propõe a abolição do imposto de renda e a privatização de quase tudo que o governo faz, incluindo a educação. "Restauraríamos a autoridade dos pais para determinar a educação de seus filhos, sem a influência do governo". E se os pais não desejarem que suas crianças recebam educação, ou preferirem que sejam doutrinadas por um culto, ou as forçarem a trabalhar em uma fábrica em lugar de aprenderem a ler. Não é problema nosso.

    O que realmente me chamou a atenção, porém, foi o que a plataforma diz sobre o meio ambiente. Opõe-se a qualquer forma de regulamentação; em lugar disso, argumenta que deveríamos confiar nos tribunais. Uma empresa gigante está envenenando o ar que você respira ou a água que você bebe? Abra um processo.

    "Nos casos em que danos possam ser provados e quantificados em um tribunal, indenização às partes prejudicadas deve ser requerida". Cidadãos comuns contra equipes de advogados empresariais de alto preço —o que poderia sair errado?

    É realmente difícil acreditar que os jovens eleitores que apoiaram Bernie Sanders na primária democrática considerem que qualquer dessas coisas é boa ideia. Mas Johnson e Stein não receberam atenção alguma da mídia, e por isso os eleitores não fazem ideia daquilo que defendem.

    E os nomes de seus partidos parecem bacanas —quem dentre nós tem algo contra a liberdade? A verdade é que o Partido Libertário defende um retorno aos piores abusos da Era Dourada [o período de expansão irrestrita do capitalismo norte-americano na segunda metade do século 19], mas essa verdade não está lá fora.

    Enquanto isso, é claro, faz imensa diferença qual dos dois candidatos com chances reais de conquistar a presidência venha a vencer, e não só por conta de sua diferença de temperamento e do grau de respeito ou desprezo pelas normas democráticas que eles demonstram. As posições deles quanto às políticas públicas também são drasticamente diferentes.

    É fato que muito do que Trump diz é incoerente: em suas propostas de política econômica, um dia há trilhões de dólares em cortes de impostos, e no dia seguinte eles se foram. Mas quem quer que o defina como "populista" não está considerando o direcionamento geral de suas ideias, ou as pessoas que ele escolheu como assessores econômicos.

    O grupo de cérebros de Trump, se é que merece esse nome, é formado por economistas direitistas linha dura, adeptos do supply-side —a quem até mesmo economistas republicanos definiram como "charlatões" e "picaretas"—, e para eles impostos baixos para os ricos são a grande prioridade.

    Enquanto isso, Hillary apresentou as propostas de política pública mais progressistas já adotadas por um candidato à presidência. Não há motivo para acreditar que essas posições sejam insinceras, que ela retornaria às políticas dos anos 90 caso viesse a assumir a presidência. O que algumas pessoas hoje definem como "nova economia liberal" deitou raízes profundas no Partido Democrata, e domina as fileiras dos assessores de Hillary.

    Talvez isso não o interesse. Talvez você considere que políticas de centro-esquerda são tão ruins quanto políticas de centro-direita. E talvez você tenha conseguido reconciliar esse desdém com a tolerância pela mania de livre mercado dos libertários. Se for esse o caso, com certeza você deveria votar em Johnson.

    Mas não vote em um candidato de partido menor só para marcar posição. Ninguém se importa.

    Lembre-se de que George W. Bush perdeu a eleição no voto popular, em 2000, mas de alguma maneira terminou na Casa Branca mesmo assim, em parte graças ao voto em Ralph Nader - e imediatamente passou a governar como se tivesse vencido por margem esmagadora. Você consegue imaginar um Trump vitorioso mostrando cautela em respeito a todos aqueles votos libertários?

    Seu voto importa, e você deveria agir de acordo —o que significa pensar seriamente sobre o que deseja que aconteça nos Estados Unidos.

    Tradução de PAULO MIGLIACCI

    paul krugman

    Prêmio Nobel de Economia (2008), é um dos mais renomados economistas da atualidade. É autor ou editor de 20 livros e tem mais de 200 artigos científicos publicados. Escreve às terças e sábados.

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