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    Paul Krugman

    Poucos economistas republicanos sérios apoiam candidatura de Trump

    03/10/2016 11h24

    James Robinson/PennLive.com/AP
    Candidato republicano à Presidência dos EUA, Donald Trump
    Candidato republicano à Presidência dos EUA, Donald Trump

    Donald Trump acaba de ter uma semana extraordinariamente ruim, enquanto a de Hillary Clinton foi extraordinariamente boa. As bolsas de apostas agora calculam que a chance de vitória de Hillary é quase tão alta quanto pouco depois da convenção do Partido Democrata. Mas tanto as virtudes de Hillary quanto os vícios de Trump sempre foram evidentes. De que maneira, portanto, a disputa podia parecer tão apertada logo antes do debate?

    Boa parte da resposta, eu já argumentei, está no comportamento da mídia, que passou o mês que antecedeu o primeiro debate presidencial norte-americano tratando Hillary com aspereza, retratando pequenos deslizes como grandes pecados e inventando falsos escândalos com base em nada.

    Mas isso não significa que não haja outros culpados. Trump não teria chegado ao ponto que chegou sem o apoio, ativo ou tácito, de muita gente que compreende perfeitamente o que ele é e o que sua eleição significaria, mas ainda assim escolheu não se posicionar.

    Comecemos pela elite política do Partido Republicano, que vem apoiando Trump como se ele fosse um candidato à presidência normal.

    Tenho muitas críticas a fazer sobre Mitch McConnell, o líder da maioria republicana no Senado, e sobre Paul Ryan, o presidente da Câmara dos Deputados. Uma coisa de que jamais os acusaria, porém, é estupidez.

    Os dois sabem o tipo de homem com quem estão lidando —mas decidiram passar essa eleição fingindo que estamos discutindo políticas públicas seriamente, e que votar em Trump significa simplesmente votar em alíquotas menores para os impostos. E não deveríamos permitir que eles finjam que o seu apoio a Trump não existiu quando a eleição tiver ficado para trás.

    Isso vale especialmente para Ryan, que vem recebendo tratamento extraordinariamente favorável da imprensa há anos —ele é retratado como um político honesto, estudioso das questões públicas e sinceramente preocupado com a probidade fiscal.

    Essa reputação jamais foi merecida; suas propostas políticas sempre foram obviamente fantasiosas. Mas no passado, as críticas de Ryan dependiam de apontar para fatos inquestionáveis —como o de que seus números não costumam bater. Agora, a tarefa ficou muito fácil. A cada vez que ele for apontado como exemplo de seriedade, basta lembrar de que, na hora mais importante, ele apoiou Trump.

    Embora quase todos os republicamos detentores de postos eleitorais tenham expressado apoio a Trump, o mesmo não pode ser dito sobre o que poderíamos descrever como a intelligentsia do partido —os especialistas, reais ou autoproclamados, em políticas públicas, os colunistas, e assim por diante.

    Em geral, os membros desse grupo não se pronunciaram em favor do candidato republicano à eleição deste ano. Por exemplo, nem mesmo um integrante dos conselhos de assessoria econômica da Casa Branca em governos republicanos passados expressou apoio a Trump. Se você for verificar quem está apoiando Trump —digamos, os signatários de uma declaração de apoio divulgada pelos "Estudiosos e Escritores da América"—, perceberá que se trata de um grupo bastante patético.

    Mas se você acha que eleger Trump será um desastre, não deveria estar instando os norte-americanos a votar em sua oponente, mesmo que não goste dela? Afinal, não votar em Hillary —seja literalmente não indo às urnas, seja optando por um voto puramente simbólico em um candidato de partido pequeno— significa dar meio voto a Trump.

    É justo ressaltar que alguns poucos intelectuais conservadores, especialmente na área de política externa, aceitaram essa lógica; é preciso dar algum crédito a pessoas como, por exemplo, Paul Wolfowitz, por sua coragem política. Mas também tivemos muita gente que hesitou em fazer a coisa certa; quando Henry Kissinger e George Shultz declaram, untuosamente, que não apoiarão qualquer candidato, isso é um retrato de covardia.

    E a resposta dos economistas republicanos sãos foi especialmente decepcionante. Só charlatões e picaretas endossaram Trump, mas apenas alguns poucos economistas sérios fizeram jus à ocasião e se mostraram dispostos a declarar que, se é importante manter Trump fora da Casa Branca, é necessário votar em Hillary.

    Por fim, é desanimador perceber a irresponsabilidade das pessoas de esquerda que decidiram apoiar candidatos independentes. Algumas delas parecem acreditar na velha doutrina do fascismo social —melhor ver a esquerda derrotada pela direita dura, porque isso prepara o terreno para uma verdadeira revolução progressista. Essa ideia funcionou maravilhosamente bem na Alemanha dos anos 30, como sabemos.

    Mas a motivação da maioria dessas pessoas parece ser a política como expressão pessoal: elas não gostam de Hillary —em parte porque aceitaram a imagem enganosa que a mídia criou sobre ela—, e planejam expressar esse desapreço ficando em casa ou votando em candidatos como o libertário Gary Johnson. Se as pesquisas merecem confiança, mais ou menos um terço dos eleitores jovens pretende, para todos os efeitos, optar por ficar de fora desta eleição. E se o fizerem, Trump ainda poderia ganhar.

    De fato, o maior perigo que a semana terrível vivida por Trump traz é a de que ela poderia encorajar a complacência e a autoindulgência entre eleitores que realmente odiariam, odiariam muito, vê-lo na Casa Branca. Por isso é bom lembrar: seu voto só vale se você usá-lo de maneira que importe.

    Tradução de PAULO MIGLIACCI

    paul krugman

    Prêmio Nobel de Economia (2008), é um dos mais renomados economistas da atualidade. É autor ou editor de 20 livros e tem mais de 200 artigos científicos publicados. Escreve às terças e sábados.

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