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    Plinio Fraga

    Dias de terror no Rio se foram, mas ficaram os traumas

    27/09/2017 02h00

    Eduardo Anizelli/Folhapress
    Forças Armadas realiza operação na favela da Rocinha, zona sul do Rio de Janeiro, na tarde desta terça-feira
    Forças Armadas realizam operação na favela da Rocinha, zona sul do Rio de Janeiro

    RIO DE JANEIRO - Freud escreveu que a neurose paira no ar. Contamina suas vítimas porque abala a sustentação lógica e emocional. O momento do Rio faz com que a neurose da violência seja tão danosa quanto a violência em si. Pais impediram filhos de irem à escola após boatos dos mais variados episódios de violência. Muitas praças e restaurantes têm menos frequentadores do que o habitual.

    Há mais gente infeliz à volta. Todos temem que "algo" aconteça. Ninguém parece ver uma saída para a crise de insegurança. Não faltam relatos confiáveis alimentadores da neurose.

    É possível que haja muitos corpos abandonados em floresta próxima à Rocinha. Famílias se embrenham na mata atrás de notícias de parentes com alguma relação com as forças do tráfico em disputa. Outras abandonaram às pressas a favela por temerem represálias por filmarem traficantes em ação.

    Traficantes reconheceram janelas, prédios e vizinhanças. Agora buscam vingança contra os autores das imagens. Muitos moradores da parte alta da Rocinha —onde a maioria dos tiroteios se desenrolou— foram obrigados a mostrar se tinham imagens de traficantes gravadas em seus celulares durante revistas abusivas.

    Além do constrangimento a direitos básicos de ir e vir e de privacidade, moradores relatam terem perdido o emprego em razão de faltas contínuas.

    A presença das Forças Armadas de fato estabilizou o confronto na Rocinha. A disputa entre facções rivais cessou por ora. Incursões policiais com muitos tiros, no entanto, são testemunhadas agora.

    Foram-se os dias de terror, mas ficaram os muitos traumas. As neuroses têm origem na incapacidade de vencê-los. O Rio deixa exemplos claros de cidade traumatizada. A cidade partida, na definição precisa de Zuenir Ventura, é também cidade neurótica.

    plínio fraga

    Na Folha, foi repórter especial e editor de 'Brasil'. Foi editor de política do 'Jornal do Brasil' e repórter da 'Piauí' e de 'O Globo'. Doutorando na UFRJ e autor da biografia 'Tancredo Neves, o Príncipe Civil'

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