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    Por quê? Economês em bom português

    Reformas são necessárias. Mas com esses políticos?

    20/06/2017 05h00

    Comugnero Silvana/Fotolia
    Notas de Real
    Notas de real

    Nos primeiros anos do estudo de economia, aprendemos que o formulador de política econômica dispõe de várias alavancas para puxar e botões para apertar que afetam o desempenho da economia. Se a economia está fraca, basta saber qual é o botão e a alavanca certos para apertar ou puxar, e a economia obedecerá como um carrinho de controle remoto. É a visão da economia como sistema hidráulico, claramente uma visão simplória e infantil, mas compartilhada por muitos economistas. Nossos formuladores de política econômica que tentaram fazer o Brasil crescer via expansão de crédito dos bancos públicos e desonerações trabalhistas para setores específicos provavelmente passariam em um exame levemente rigoroso de economia hidráulica. Com uma nota 6, mas seriam aprovados.

    Quando avançamos nos estudos, somos apresentados a uma visão mais complexa. Aprendemos nos cursos mais avançados da graduação que a economia é formada por agentes que pensam, formam expectativas sobre o que vai acontecer e tomam decisões baseadas nestas expectativas. Tenho certeza de que todo economista de vinte e poucos anos já sentiu orgulho de suas realizações intelectuais quando pela primeira vez conseguiu entender as consequências da formação de expectativas em um modelo macroeconômico. Quando permitimos aos agentes econômicos de fato tomar decisões, muitas das conclusões do sistema hidráulico tornam-se erradas. É neste estágio, depois dos cursos avançados da graduação, que os economistas passam a entender conceitos como credibilidade e se tornam mais cautelosos na condução da política monetária em um ambiente inflacionário e valorizam ideias como a emenda constitucional criando um teto nos gastos públicos.

    Mas este não é o fim do aprendizado. Infelizmente, os cursos de economia em geral ensinam apenas superficialmente uma importante camada de complexidade cujo entendimento é absolutamente necessário para os formuladores de política econômica. As decisões sobre a política econômica acontecem dentro de um sistema político. Em uma democracia, a sustentabilidade de medidas econômicas depende da criação de um consenso entre os governantes e pelo menos uma maioria dos governados, e isso depende de como os governados (eleitores) formam suas expectativas e visões do mundo.

    Hoje o Brasil está imerso em uma de suas piores crises políticas. A população acredita que é governada por políticos que se preocupam apenas em ganhos pessoais e para suas camarilhas. Tal crença tem sido confirmada por gravações, delações premiadas e ampla evidência de muitos políticos vivendo acima de sua renda. Surpreendentemente para a maioria dos analistas, também vivemos um momento especial em que pode ser possível aprovar reformas importantes e necessárias que aliviam problemas que aleijam nosso crescimento. Um exemplo é a reforma da Previdência. Não há dúvida alguma entre pessoas de boa vontade com algum domínio da aritmética que a Previdência em sua forma atual é insustentável. Finalmente temos a chance de consertar o problema! Devemos ir em frente, destemidos, com a agenda de reformas?

    O economista dentro de mim diz: "sigamos em frente, a oportunidade é única". Mas este economista está perdendo uma parte importante da análise. Medidas econômicas de grandes consequências, como a reforma da Previdência, geram ganhadores e perdedores. Para que não sejam revertidas sob a pressão dos que se sentirem prejudicados, precisam de legitimidade. Mas boas ideias defendidas por políticos desmoralizados podem deixar de ser vistas como boas ideias.

    "Mas as reformas são necessárias!", protesta o economista que fez os cursos avançados. Ele está correto. Sem as reformas, os agentes econômicos vão entender que o Brasil está em uma trajetória insustentável da dívida pública e mais cedo ou mais tarde podem se recusar a financiar o governo, gerando altas da inflação e taxas de juros e um mar de lágrimas de dor. Mas a visão do mundo do economista é incompleta e simplista. Não basta que as reformas sejam factíveis politicamente (isto é, aprovadas pelo Poder Legislativo). As reformas devem também ser legítimas e consideradas justas por uma ampla maioria da população. Infelizmente, ainda não chegamos lá. Para começar, precisamos perder o medo de ser roubados toda vez que um político aparece na televisão para explicar as reformas...

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