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    Raquel Landim

    A Turquia e o lobby imaginário dos juros

    31/01/2014 10h12

    A Turquia é um exemplo contundente do preço que um país paga por ter um governo que constrange o trabalho do seu Banco Central para marcar pontos políticos internos.

    Com um déficit de US$ 60 bilhões e dívidas das empresas em moeda forte que chegam a US$ 167 bilhões, o país está no centro do furacão que se abateu sobre emergentes depois que os Estados Unidos começaram a normalizar sua política monetária.

    Para tentar conter a desvalorização da lira, o BC turco finalmente elevou os juros de 4,5% para 10%. A magnitude do aumento foi surpreendente, mas o impacto no mercado cambial foi pequeno.

    Seguramente as declarações do primeiro ministro, Recep Tayyip Erdogan, não ajudaram. Em entrevista a repórteres locais, ele alertou o BC de que sua "paciência tem limites" e que já está trabalhando num "plano B e até C" se a alta de juros não funcionar.

    Erdogan também repetiu as maluquices que vem defendendo durante todo o seu governo. Segundo ele, existe um "lobby dos juros altos" tramando contra o crescimento da Turquia.

    O mandatário turco também contrariou a teoria econômica e disse que juros altos colaboram para aumentar a inflação. "Se você aumenta os juros, a inflação sobe. Se você reduz (os juros), ambos caem juntos. Quando você pensa que são inversamente proporcionais, os resultados são muito piores".

    Aumentar os juros é um instrumento clássico de combate a inflação, porque encarece os empréstimos, reduzindo a demanda e obrigando as empresas a baixar os preços dos bens e serviços. Não dá para imaginar qual é a lógica contrária a que ele se refere.

    Erdogan está envolvido em uma crise política por conta de um escândalo de corrupção que já derrubou seus colaboradores mais próximos e enfrenta eleições para o Congresso nos próximos meses, fundamentais para manter o governo em um país parlamentarista.

    Ele provavelmente acredita em tudo que diz, mas também está jogando para a plateia. A questão é que, enquanto seu primeiro-ministro enfrenta um lobby imaginário pelos juros altos, a Turquia tem problemas reais e não está afastado o risco de uma quebra, que jogaria os emergentes numa situação crítica.

    No Brasil, a independência do BC foi bastante questionada no governo Dilma, mas felizmente não perdeu tanta credibilidade quanto na Turquia. Pode até ser que membros do governo compartilhem as mesmas crenças do premiê turco, mas eles não têm coragem de admitir em público. Para o bem do país, é melhor que fiquem bem quietos nesse momento de estresse global.

    raquel landim

    Jornalista formada pela USP, escreve sobre economia e política às sextas-feiras.

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