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    Raquel Landim

    O áudio e a ata

    08/05/2015 09h39

    As atas do conselho de administração da Petrobras nem de longe demonstram a batalha em que se transformaram as reuniões do comando da maior empresa do país depois do início das investigações da Operação Lava Jato.

    Essa colunista leu nesta quinta-feira (7) a ata da reunião do dia 27 de janeiro deste ano e ouviu o áudio do mesmo encontro, que durou mais de oito horas. A diferença é gritante, a despeito da formalidade que requer uma ata e da naturalidade de uma gravação de áudio.

    Naquele dia, o encontro culminou com a decisão de informar ao mercado sobre um cálculo feito a pedido da própria empresa que demonstrava uma enorme desvalorização do seu patrimônio por conta da corrupção e da má gestão. As perdas chegavam a mais de R$ 88 bilhões.

    Posteriormente o cálculo terminou descartado e a Petrobras acabou reconhecendo uma desvalorização de quase R$ 45 bilhões em seus ativos. Em contabilidade, dependendo das premissas adotadas, o chamado "valor justo" de um ativo pode variar muito. Mas, na época da realização daquele encontro, o cálculo em questão era a melhor diretriz que a Petrobras possuía e divulgá-lo era a coisa certa a fazer.

    Pela ata do encontro, Guido Mantega, ex-ministro da Fazenda e então presidente do conselho, apenas "pontuou seu entendimento do valor justo dos ativos mostrar-se inadequado". No áudio, porém, ele foi muito além e tentou impedir que o número fosse divulgado.

    Mantega disse que o cálculo era uma "temeridade", prejudicaria a companhia, e que a "empresa não divulgava outros estudos técnicos". E bateu de frente com Graça Foster, presidente da empresa. Ela, que sempre foi aliada do governo, dessa vez estava com medo de ser punida pela CVM.

    Na realidade, o governo estava muito incomodado em admitir publicamente pela primeira vez o tamanho do descalabro em que a gestão da Petrobras se transformou nos últimos anos. O desconforto foi tão grande que Graça perdeu o cargo dias depois, demitida pela presidente Dilma Rousseff.

    A Petrobras entregou à CPI do Congresso as atas das reuniões de 2005 para cá, mas os áudios apenas dos encontros realizados a partir de setembro do ano passado. A empresa não é obrigada por lei a gravar suas reuniões em áudio, mas, se o mesmo padrão se repete em todas as atas, informações importantes se perderam.

    Informações que poderiam ajudar a esclarecer a participação da própria presidente Dilma, que presidiu o conselho da Petrobras quando era ministra em episódios polêmicos como a compra da refinaria de Pasadena e a explosão de custos das refinarias de Abreu e Lima e do Comperj.

    raquel landim

    Jornalista formada pela USP, escreve sobre economia e política às sextas-feiras.

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