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    Raquel Landim

    Como a cultura de corrupção se instala nas empresas

    28/10/2016 10h24

    Petrobras, Embraer, Odebrecht, Camargo Correa, Andrade Gutierrez, Bradesco, Gerdau. A lista acima poderia ser um ranking das maiores empresas brasileiras, mas não é.

    São exemplos de companhias suspeitas ou já comprovadamente envolvidas em algum crime de corrupção ou prática ilegal: pagamento de propina, formação de cartel, lavagem de dinheiro, sonegação fiscal.

    Desde o início da Operação Lava Jato, quando a Polícia Federal começou a prender não apenas os corruptos, mas também os corruptores, mais de uma dezena de presidentes de grandes empresas brasileiras foram presos e/ou indiciados.

    E pelo menos três grandes companhias —Petrobras, Embraer e Odebrecht— são alvo de investigações dos órgãos reguladores ou processos movidos por acionistas minoritários nos Estados Unidos. Nesta semana, a Embraer admitiu pagar propina para conseguir contratos no exterior e foi multada em US$ 206 milhões.

    "Não é um problema decorrente de algumas poucas maçãs podres. Essas companhias desenvolveram um sistema de comando disfuncional que induz pessoas comuns a se tornarem eticamente cegas", diz Alexandre di Micelli, consultor e professor da Fecap.

    Para Micelli, a cegueira ética dos executivos é resultado de diversos tipos de pressão, que ajudam a explicar essa "cultura corporativa da corrupção", responsável por criar modelos de negócio que só se tornam rentáveis por causa de práticas ilegais.

    Ao ingressar nas empresas corruptas, os executivos são submetidos a pressões dos chefes, de seus pares e do cargo que ocupam. Algumas práticas ilegais são erroneamente reconhecidas como "normais" naquele setor.

    Até a linguagem é distorcida. No dia a dia das empresas, a propina se torna apenas pagamento de "comissão" e os funcionários públicos corrompidos são chamados de "consultores".

    A maneira como a vida executiva funciona também não ajuda: as pessoas estão submetidas a metas irrealistas de desempenho e sujeitas a um sistema de incentivo baseado apenas no resultado financeiro.

    Uma observação: não se trata aqui de eximir os executivos de culpa. São homens e mulheres adultos que cometeram crimes e devem pagar por isso. O objetivo é deixar claro que o crime não está restrito a algumas poucas pessoas, mas à maneira como as empresas funcionam.

    Para o professor Micelli, a situação não vai se resolver enquanto as lideranças das companhias continuarem a buscar o lucro acima de tudo e seguirem insensíveis ao papel social da empresa. Mas isso é possível? A busca do lucro não está na essência do capitalismo?

    Algumas experiências no exterior mostram que o consumidor começa a optar e até pagar mais por produtos de empresas que não agridem o meio ambiente, não exploram seus trabalhadores e não pagam propina. Oxalá, essa moda pegue por aqui também.

    raquel landim

    Jornalista formada pela USP, escreve sobre economia e política às sextas-feiras.

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