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    Rede Social - Eliane Trindade

    Cantora brasileira mora no castelo de Sissi, a lendária imperatriz da Áustria

    01/03/2016 02h00

    Como uma princesa aprisionada em sua torre, Daniela Procopio, 42, enfrenta dificuldades prosaicas toda vez que precisa pedir uma pizza ou um táxi quando está em seu apartamento em Viena.

    Tudo por conta do seu endereço na capital austríaca: o palácio de Schönbrunn, um dos principais monumentos históricos da Áustria, antiga residência de figuras lendárias.

    Entre elas, Sissi, apelido de Isabel da Baviera (1837-1898), imperatriz imortalizada pela atriz Romy Schneider em filme de 1956, e Leopoldina (1797-1826), a nobre austríaca que se casou com dom Pedro 1º e se tornou imperatriz do Brasil, nome de rua e de escola de samba no Rio.

    "Ninguém acredita quando digo que estou morando em Schönbrunn. Como o delivery de pizza vai entrar ali?", diverte-se a cantora brasileira, filha de Celita Procopio de Carvalho - presidente do Conselho Curador da Faap.

    Os taxistas costumam ser os mais céticos. "Fui pedir um táxi para o aeroporto e a mulher batia o telefone quando eu dava meu endereço. Na quinta vez, eu disse: 'Vou chamar a polícia, senão perco meu voo para o Brasil.'"

    COMO EM VERSALHES

    Apostando em um carreira na Europa, Daniela passa temporadas no apartamento que aluga há um ano e meio no que é considerado o Palácio de Versalhes local.

    Ela diz, sem revelar valores, que é mais barato do que alugar um imóvel de luxo em uma área nobre do Brasil.

    Na internet, um apartamento de um quarto no mesmo bairro de Hietzing e a cinco minutos de Schönbrunn a pé pode ser alugado na baixa temporada por R$ 7 mil ao mês.

    "Pago um aluguel no palácio comparável a qualquer outro na mesma área. No Rio, não conseguiria alugar pelo mesmo valor nem um apê menor", compara.

    Seu endereço na capital fluminense é na também nobilíssima Vieira Souto, em Ipanema.

    CONEXÕES VIENENSES

    Daniela credita o achado em Viena à sorte e às boas conexões vienenses, já que o marido, o advogado Gustavo Cortes de Lima, tem negócios com austríacos.

    "Foi a 'Gueixa Tropical' que me deu isso. A menina tinha ouvido meu CD e ficou fã", diz.

    A cantora se refere ao segundo disco, lançado em 2013, e à advogada Megui Kramer, que tem escritório em uma das alas do palácio.

    Dona de uma voz marcante e parceira de João Donato e Carlinhos Brown, a brasileira conta como seu canto acabou por levá-la à propriedade de verão dos Habsburgo.

    Show de Daniela Procopio no Tunnel em Viena

    Ao visitar o tal escritório de advocacia e fazer ali de improviso um showzinho à capela, Daniela descobriu que havia imóveis disponíveis para alugar.

    "Então, é aqui que eu quero ficar", teria dito aos anfitriões.

    No dia seguinte, foi dar um rolê para descobri como se aluga um "cafofo" no castelo barroco de 1743 que abriga ainda um museu e é cercado por belos jardins e um parque com um famoso zoológico.

    "Primeiro, me mostraram um espaço na antiga ala dos serviçais. O teto era muito baixo. Sou filha de Iansã. Logo me deu um negócio, não consegui ficar ali."

    Foi quando a funcionária disse que havia outra opção dentro do castelo. "Eu já comecei a tremer de nervoso. Sei que foi um presente."

    LOCALIZAÇÃO E VISTA PRIVILEGIADA

    A brasileira acabou alugando um dos dois apartamentos privativos localizados no andar de cima do museu.

    Os janelões laterais do imóvel dão para o jardim secreto, onde os príncipes desfrutavam de privacidade. "Eles tinham um cercadinho."

    A brasileira avista ainda dos seus domínios os vastos jardins abertos à visitação.

    "Eu tenho a chave do castelo e do jardim", explica ela, que usa um chaveiro em forma de coroa comprado na lojinha de souvenirs de Schönbrunn.

    Daniela conta com graça como foi a sua primeira incursão pela nobiliárquica propriedade.

    "Na tarde que pegamos as chaves, meu marido tinha uma reunião e eu fui passear pelo castelo. Era umas 9h da noite, mas em setembro ainda estava claro."

    Foi andando e cantando pelo jardim até chegar à Gloriette [monumento no interior do parque]. "Fiquei emocionada. Cantei para saudar o castelo e para os seres que ali habitaram."

    Quando se deu conta já passavam das 22h e o acesso ao castelo estava trancado. "Queria pular a grade. Ia começar a esfriar."

    Gritou, em inglês, para uma mulher em um edifício próximo. "Por favor, me salve. Estou presa aqui."

    Conseguiu explicar que morava no palácio: "Se você mora aí você tem a chave do jardim". Foi a dica para ela se acalmar e testar a chave na fechadura e poder voltar ao castelo.

    ESPÍRITO DE LEOPOLDINA

    Devidamente instalada, ela fez amizade com a única vizinha. "Bati na porta dela para pedir ajuda para fechar o corpete que ia usar em um show."

    Descobriu que Gelfrite fala português e viaja sempre a Portugal. "É o espírito da Leopoldina que ainda reina ali", brinca a brasileira.

    Ao desembolsar 15 euros para visitar o museu no andar de baixo, caiu a ficha de Daniela de que seu quarto fica bem em cima do aposento onde está em exibição um retrato da antiga imperatriz do Brasil.

    O áudio guia da exposição surpreendeu Daniela com farpas sobre a vida da imperatriz no Brasil. "Dom Pedro foi de quinta com ela. Dona Leopoldina morreu de sofrimento."

    Ao se debruçar sobre o mapa do castelo, mais uma descoberta. "Minha cama fica em cima da cabeça da Leopoldina. É ela quem puxa o meu pé."

    Logo na primeira noite em Schönbrunn, Daniela garante ter feito um trato com os fantasmas.

    "Naquele lugar foram travadas muitas batalhas. O palácio foi bombardeado. Dentro de seus muros foram decididas guerras. Existe um centro de energia esquisito ali. Sou esponja, supersensível."

    Sissi também teria deixado uma energia pesada, segundo a inquilina brasileira. "Ela era anoréxica, depressiva, acabou responsável pela queda do império e tiraram o filho dela."

    FANTASMAS AMIGOS

    Definindo-se como "super espiritualizada desde pequena", a brasileira diz não temer os espíritos.

    "Logo que entrei no apartamento, eu disse [aos fantasmas]: 'Olha, eu tô aqui, sei que vocês foram me chamar. Vamos ser amigos."

    E diz ter mandado recado também para os menos amistosos: "Uma vez, eu vi um vulto. E logo avisei: 'Aqui não'. Tô viva. Sou mais forte."

    Garante que o sono é tranquilo em Schönbrunn. "Não tenho medo. Nem de mortos nem dos vivos. É um dos lugares onde melhor durmo na vida. Estou deitada no berço da Áustria, com segurança máxima. Tem um serviço de inteligência dentro do castelo."

    É na paz do palácio histórico que ela trabalha em um musical baseado no disco 'Gueixa Tropical", em parceria com o produtor austríaco Nikki Neuspil.

    O enredo já foi formatado com a ajuda do diretor gaúcho Ike Gomes, do "Tangos & Tragédias".

    "A gueixa é meu alterego. Se existe outras vidas, já fui oriental. É a história de uma garota de raízes indígenas que se apaixona pelo Oriente."

    De família tradicional, a cantora não nega a própria origem miscigenada.

    "Que família que chega ao Brasil em 1.500 não vai ter origem indígena e negra? Não dá para esconder. Olha a minha cara. Tá em mim."

    Daniela descende dos Pessoa de Queiroz e Vasconcelos, "que vieram montar as capitanias e se misturam muito", diz ela.

    "Sou genuinamente brasileira, filha de pernambucano com paulista, neta de carioca. Sou aquela música do Chico [Buarque]."

    Cantarola "Paratodos" e emenda que é também de origem italiana. É prima do conde Chiquinho Scarpa que, admite, combina bem mais com o castelo na Áustria.

    "A coisa mais engraçada é que a hippie da família foi parar no castelo. Para o pessoal de São Paulo, eu sou riponga, enquanto no Rio, me acham patricinha, socialite."

    PÉ NA AREIA

    Ela encarna a hippie em tempo integral na Bahia, onde se refugia em um cantinho da ilha de Boipeba há cinco verões.

    "Descobri Moreré e fico largada lá em um lugar especial, atrás de uma biblioteca, onde a dona da casa colocou uma cama pra mim. Meu quarto não tem parede nem porta, só uns véus. É pé na areia."

    De sandália de borracha no litoral baiano ou de salto agulha nos salões vienenses, ela diz que valoriza tudo o que a vida lhe proporciona.

    "Não sou blasé. Tenho mania de me deslumbrar com a beleza das coisas. No Rio. Na Bahia ou em Viena."

    E a hippie do castelo já fez piquenique nos jardins e saraus nos salões de Schönbrunn, enquanto termina de montar o apartamento vienense.

    "Já comprei uma cama e um sofá-cama, uma escrivaninha e descolei móveis emprestados de amigos de lá."

    Segundo ela, a cozinha era o ponto franco, mas agora tem geladeira e fogão (de duas bocas). "Eu tô acampada até hoje", brinca ela, de malas prontas para deixar o apartamento em frente ao mar de Ipanema para voltar ao castelo.

    No domingo (6), a inquilina de Schönbrunn faz o primeiro show do ano em Viena, no Hard Rock Café, encarnando sua gueixa tropical.

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    por Eliane Trindade

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    É editora do Prêmio Empreendedor Social. Aqui, mostra personagens e fatos dos dois extremos da pirâmide social. Escreve às terças, a cada duas semanas.

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