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    Reinaldo Azevedo

    O Estado bandido. E absolvido

    05/06/2015 02h05

    Também os safados têm de contar com a "virtù" e com a "fortuna", com a disposição subjetiva para o crime e com as circunstâncias que lhes facultem cometê-lo.

    Esses príncipes da roubalheira que infelicitam o Brasil encontram na estrutura do Estado as condições necessárias, mas ainda não suficientes, para exercer o seu ofício.

    É preciso também que se respire uma esfera estatista, uma cultura do ódio à iniciativa privada, à empresa e ao lucro.

    Dados esses elementos, pronto! Esse país poderá continuar deitado eternamente em berço esplêndido.

    Seu apogeu coincidirá com a mediocridade.

    No médio e no longo prazos, pior que o petrolão é o crime intelectual e moral que se está cometendo no Brasil. E a gama de culpados, nesse caso, é gigantesca, a começar da imprensa.

    Caímos no conto do vigário de que a Petrobras foi vítima de uma quadrilha e que não integra, ela própria, o grupo de malfeitores.

    Não há dúvida de que empreiteiros atuaram contra os interesses do país, buscando maximizar ganhos fora das regras do jogo. Ocorre que esse jogo tinha um juiz -e, no caso específico, era a própria estatal.

    Em sentido mais amplo, é o governo que manipula o aparato normativo do Estado.

    A tese de um cartel contra uma "vítima" chamada Petrobras, compartilhada pelo juiz Sérgio Moro e pela Procuradoria Geral da República, na qual se refestela o jornalismo, torna o país mais burro e o condena a um destino: não passará muito tempo, e assistiremos à eterna volta do mesmo.

    Como pode haver cartel quando há uma só fonte contratadora, um só cliente, com capacidade pra ditar o preço? Há no petrolão crimes aos montes e para todos os gostos, sim, mas não esse. Insistir nessa tecla -e pouco me importa quantos presos foram levados a admitir a prática como condição para os benefícios da delação premiada- corresponde a eternizar as condições habilmente manipuladas por ladrões talentosos.

    Essa dependência mental do estatismo traz riscos efetivos.

    Como subproduto desse Estado absolvido e "vítima", supostamente assaltado por homens maus, o país ficou a um passo -e ainda está sob ameaça- de ver proibida a doação de empresas privadas a campanhas eleitorais.

    Não por acaso, essa é a proposta do PT, partido que mais arrecada e que é protagonista do petrolão. Segundo essa tese, políticos ladrões são apenas homens bons, que caíram em tentação, à espera de financiamento público. Lixo!

    Eduardo Cunha e Renan Calheiros apresentaram uma proposta para submeter as estatais ao controle do Congresso. Chegaram a falar até em sabatina para candidatos a presidente das ditas-cujas. Depois houve um recuo nesse particular.

    O PSDB entrou no debate com um outro projeto, que também limita os poderes olímpicos do Executivo nessa matéria.

    As duas iniciativas foram recebidas ou com frieza burocrática ou pelo viés da guerrilha particular promovida contra Dilma pela dupla de peemedebistas e pela oposição -como se ela não fosse só o que passa, e o Estado pantagruélico, o que fica.

    O fato de a vida pública brasileira não se distinguir de casos de polícia -e isso só acontece em razão do gigantismo estatal- nos levou ao abandono do debate político e de seus marcos. Um bom jornalista da área pode dispensar Maquiavel como fonte. Mas terá de apelar necessariamente a delegados e procuradores que vazem informações.

    Não sairemos facilmente da lama.

    reinaldo azevedo

    Jornalista, é colunista da Folha e autor de um blog na RedeTV!. Escreveu, entre outros livros, 'Contra o Consenso' e 'O País dos Petralhas' e 'Máximas de um País Mínimo'.
    Escreve às sextas-feiras.

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