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    Rita Siza

    Jogar futebol na era ultra-moderna

    DO PORTO

    22/02/2013 14h15

    Os jogos de futebol para computador pessoal festejam este ano o seu 35º aniversário. Ou dito de forma mais correcta, foi há exactamente 35 anos que apareceu o primeiro jogo de computador que reproduzia, virtualmente, exactamente as regras e as condições em que se desenrola na vida real o esporte mais famoso do mundo - num campo relvado, com duas balizas, onze jogadores de cada lado, e em que ganha a equipa que marcar mais golos.

    Até então, a simulação das emoções do futebol só estava ao alcance daqueles que arriscavam levantar do sofá, juntar-se a uns quantos amigos e chutar uma bola: na calçada, na praia, no ginásio, no pátio ou no jardim, no fim da escola ou depois do trabalho, ao fim-de-semana, enquanto o sol ainda brilhava ou testando a resistência à chuva...

    O aparecimento destes simuladores electrónicos foi, por isso, uma verdadeira revolução, uma mudança de paradigma. Agora, é fácil encontrar especialistas em penalidades ou passes de trivela que nunca na vida calçaram umas chuteiras. Os gordinhos, caixa-de-óculos, desajeitados e azarados passaram a ter uma maneira de explorar a sua arte e técnica sem as desilusões próprias dos seus constrangimentos físicos e da maldade dos seus pares.

    Aliás, agora qualquer um pode ser Garrincha, Pelé, Zico, Romário ou Ronaldo sem mudar de camisola. Quando eu era uma miúda de dez anos e ainda arriscava jogar à bola no recreio da escola, era sempre o Filipovic, o goleador montenegrino (na altura ainda jugoslavo) do Benfica, com quem obviamente não tinha uma única semelhança: acima de tudo, jogávamos com a imaginação.

    Hoje, na consola ou no computador, posso não só ser uma cópia a carbono do meu jogador preferido como manobrar a equipa toda, e ainda corrigir todos os defeitos e colmatar todas as lacunas só carregando no botão: mais precisão no passe, mais agressividade nos cortes, mais velocidade na corrida, melhor impulsão nos cabeceamentos. Sem me mexer nem cansar, posso ser um craque.

    Isto tudo a propósito do filme que descobri (através do britânico The Guardian) no YouTube cobre os tais 35 anos de evolução dos jogos de computador de futebol. São 34 minutos de pura nostalgia e divertimento, embora confesse que a novidade do RealSport Soccer ou do Match Day, alguns dos primeiros jogos distribuídos na década de 80, me passou quase completamente ao lado.

    No meu círculo de amigos, havia poucos com ZX Spectrum ou Atari, e como acontecia nos jogos a sério, quem não exibisse de imediato uma predisposição natural para o jogo logo era preterido pelos mais dotados, e tinha de esperar que os outros jogadores se fartassem (ou se distraíssem) para poder chegar ao joystick.

    Quem quiser espreitar, pode buscar o filme "Football Games History - 35th Anniversary", da produtora Davero Films. E para tornar a experiência ainda mais bizarra, tente encarar o vídeo como um objecto artístico, uma ode à evolução do futebol da era ultra-moderna. Se não, vai acabar viciado nos comentários dos "nerds", que por direito próprio mereceriam uma coluna inteirinha só para eles.

    rita siza

    Escreveu até dezembro de 2013

    É jornalista do diário português "Público", onde acompanha temas de política internacional, com ênfase na América Latina. Do futebol ao pebolim, comentou sobre diversos esportes, com particular atenção às Olimpíadas.

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