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    Rita Siza

    Vantagem para Portugal

    15/11/2013 21h44

    Colegas bem mais experientes do que eu, e acostumados com as idiossincrasias da selecção portuguesa de futebol, garantem que só se pode contar com os rapazes nos "jogos grandes", quando "é mesmo a sério", quando --como diria Luiz Felipe Scolari-- chegamos ao mata-mata.

    Como se por acaso os jogos da qualificação para a Copa do Brasil fossem uma brincadeira de garotos, sem qualquer interesse, ou como se jogar contra equipas que ficam muitos furos abaixo de Portugal no ranking da Fifa desmerecesse qualquer esforço.

    Odeio essa teoria por inúmeras razões, mas se a primeira mão do play-off contra a Suécia, na sexta-feira à noite em Lisboa, serviu de alguma coisa, foi para perpetuar essa lengalenga: com tudo em causa, e a passagem para o Brasil em aberto, os portugueses arrancaram uma vitória sofrida mas justa.

    Tendo em conta o nível exibicional de Portugal durante a fase de apuramento, o jogo de ontem foi bastante positivo. O time entrou bem no jogo, decidido e até um pouco atrevido, mas não foi capaz de evitar calafrios. Muitas fragilidades são ainda por demais evidentes, e os suecos traziam a lição bem estudada --aliás, na primeira parte, muito equilibrada, pertenceram aos visitantes as oportunidades mais flagrantes de golo.

    Em termos de gestão do time, o trabalho do seleccionador da Suécia, Erik Hamrén, não deve ser muito difícil. Depois de decidir a estrutura, é quase como pôr de pé um móvel do Ikea: ordenar as peças, respeitar as instruções, que são bem claras, sem saltar etapas, sem forçar o material, sem esquecer de ajustar e apertar bem. Óbvio que o resultado final não é terrivelmente original - como todos os clientes da cadeia sueca de mobiliário bem sabem, aquilo não é bom por que é extraordinário, mas porque é de confiança, bem feito, durável.

    E foi assim que a Suécia jogou, bem encaixada, disciplinada, rigorosa, atenta; sem extasiar mas sempre perigosa, a selecção sueca foi competente e competitiva. O seu processo é simples, mas não tosco, e a sua equipa é sólida. A eliminatória ficou mais difícil, mas enganam-se os que pensarem que ficou fora do seu alcance.

    Já treinar Portugal é outra história. O seleccionador é uma espécie de maestro de uma orquestra de fadistas e guitarristas: tantas e tantas vezes o talento e o virtuosismo ficam perdidos no meio de tanto lamento e tristeza. Há emoção, é certo, mas demasiadas vezes é a angústia, a desesperança, a saudade --do que foi, do que podia ter sido.

    Aliás, tipicamente, ontem podia ter sido bem melhor. Num jogo de sentido único durante a segunda parte, Portugal revelou qualidade ofensiva, mas também pouco discernimento e muito desperdício. Como sempre, perdeu tempo com adornos desnecessários, mostrou ansiedade e sofreguidão, muita alma e pouca calma, e por isso o resultado foi escasso.

    E se não fosse Cristiano Ronaldo, poderia mesmo ter sido nulo. O capitão português, protagonista maior do jogo de sexta-feira, não só desbloqueou o resultado e colocou a selecção nacional à porta do campeonato do Mundo, como provou (pela enésima vez) que é o jogador providencial e decisivo que merece que se acabe de uma vez com a baboseira da discussão sobre o "melhor jogador do mundo".

    rita siza

    Escreveu até dezembro de 2013

    É jornalista do diário português "Público", onde acompanha temas de política internacional, com ênfase na América Latina. Do futebol ao pebolim, comentou sobre diversos esportes, com particular atenção às Olimpíadas.

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