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    Rogerio Chequer

    Reforma política - um guia de bolso

    24/08/2017 11h41

    Pedro Ladeira/Folhapress
    Sessão no plenário da Câmara dos Deputados, em Brasília (DF) referente a votação da PEC da reforma política
    O plenário da Câmara dos Deputados, em sessão da reforma política

    A reforma política atingiu no Congresso um estágio de confusão tão vergonhoso que poucos entendem o que está acontecendo. Até especialistas estão sem rumo.

    A Comissão Especial da Câmara passou três meses discutindo possibilidades, apenas para chegar a um texto sem consenso e sem constitucionalidade. A situação é bizarra. Pressionados pelo prazo, os deputados buscam alternativas novas, nunca antes discutidas na Comissão, nunca discutidas com a sociedade. No desespero de quem quer garantir sua reeleição, os riscos de uma manobra antidemocrática aumentam.

    No meio da bagunça, é importante saber para onde olhar. Seguem as principais armadilhas.

    Financiamento público: o escandaloso fundo de três bilhões e seiscentos milhões de reais (escrito por extenso dá mais dimensão da ofensa ao dinheiro do contribuinte), equivalente a cem hospitais, já está fora de cogitação. O que se espera agora é a aprovação do fundo para cada eleição, desde que caiba no Orçamento. A pegadinha é definir quanto cabe no Orçamento. Uma diretriz: qual o valor que cabe num Orçamento que já tem prejuízo de R$ 139 bilhões?

    Financiamento privado: parece que falar de financiamento privado é querer resgatar a propina das empreiteiras. Não é, desde que as doações tenham limitação de valor por conglomerado de empresas, não possam ser feitas a todos (a JBS teria doado a 1.829 candidatos) e que sejam feitas com transparência, para que a população saiba quem doou para quem, e fique de olho nas relações. É fundamental que sejam proibidas doações a empresas que prestam serviço ao governo, e que doadores não possam se tornar prestadores de qualquer serviço.

    Sistema eleitoral: aqui, o menu é deprimente. O sistema proporcional atual é consensualmente falido. O melhor sistema, a maioria concorda, é o distrital. Mas os congressistas querem tentar enfiar o distritão goela abaixo da sociedade e da base dos partidos, que teme não se reeleger com ele. Para piorar, sugerem agora um tal de distritão misto, nunca antes discutido, e que não tem paralelo em qualquer lugar do mundo. É a nova jabuticaba eleitoral.

    Seja qual for a combinação de financiamento e sistema, é importante a sociedade cobrar do Congresso a aprovação, mesmo que para 2022, do voto distrital misto. Muito mais barato, e dando o primeiro passo para aproximar eleitos de eleitores, esse é o ponto mais importante da reforma. Sem ele, nenhuma outra mudança compensa para a sociedade.

    Existem alguns coelhos doentes que os parlamentares podem tentar tirar da cartola. Menciono apenas três deles. O fim das coligações, já acordado, não pode regredir, sob risco de fomentar os partidos de aluguel. Também não pode ser admitida qualquer tentativa de ocultar identidade de doadores —aberração que constava do relatório de Vicente Cândido (PT-SP). E o terceiro coelho pode causar prejuízo duradouro. Não se pode, na última hora e com a desculpa da falta de tempo, aprovar apenas um novo fundo público e deixar de lado o sistema distrital para 2022. A sociedade não pode aceitar tal manobra.

    Fiquemos atentos. Se deixarmos, eles criam sistema e financiamento inovadoramente perversos. Vale tudo para serem reeleitos.

    Tudo isso gera indignação e energia de revolta. Não a desperdice reclamando, use-a de forma construtiva. A sociedade que percebe os riscos à frente está indo às ruas nesse domingo para defender um sistema que aumente a combalida representatividade. Melhor sair do sofá agora. Reclamar depois não vai adiantar.

    rogerio chequer

    Escreveu até dezembro de 2017
    rogerio chequer

    É sócio da empresa SOAP. Engenheiro de produção pela USP, atuou por 18 anos no mercado financeiro e foi líder do Movimento Vem Pra Rua nos últimos três anos.

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