• Colunistas

    Tuesday, 07-May-2024 21:09:24 -03
    Rogério Gentile

    Arroubo retórico

    21/01/2016 02h00

    SÃO PAULO - Advogados de acusados pela Operação Lava Jato iniciaram uma guerra política a fim de tentar compensar as dificuldades jurídicas ocasionadas pelas delações contra os seus clientes.

    Repetindo a estratégia malsucedida da época do mensalão (quando o alvo era Joaquim Barbosa), divulgaram uma carta acusando os investigadores e o juiz Sergio Moro de promoverem uma espécie de "inquisição" –"em que já se sabe, antes mesmo de começarem os processos, qual será o seu resultado".

    O exagero argumentativo dos advogados, no entanto, diz mais sobre a debilidade de suas causas do que o próprio insucesso, até aqui, ao menos, da maioria dos recursos impetrados nos tribunais superiores.

    O advogado Técio Lins e Silva, que defende um ex-diretor da Odebrecht, chegou a dizer que a Operação Lava Jato é pior do que a ditadura militar. "Estou falando de uma arbitrariedade como nunca se viu no Brasil", afirmou à Folha.

    Para contrapô-lo, contudo, basta relembrar o que disse anos atrás sobre a ditadura militar o próprio Técio Lins e Silva, que advogou para presos políticos e conseguiu, literalmente, salvar a vida de vários deles.

    "O AI-5 proibiu o habeas corpus para crime político. Você era preso e não podia mais recorrer."; "A lei permitia ao policial decretar a prisão por trinta dias e a incomunicabilidade por dez."; "O preso sumia, era difícil localizá-lo. Muitos nunca mais foram achados."; "Vários clientes ficavam presos encapuzados."; "Ela ficou tantas horas no pau de arara que teve uma ruptura no nervo ciático poplíteo externo, que é o que faz o pé dar sustentação ao corpo."

    É possível que a Lava Jato tenha cometido ilegalidades –cabe à própria Justiça analisá-las.

    De qualquer modo, ainda que isso seja verdade, a comparação com a ditadura é descabida e grosseira. Mais do que um trivial abuso retórico de advogado, o que houve foi um desrespeito às vítimas do regime militar.

    rogério gentile

    Escreveu até março de 2016

    Foi secretário de Redação da Folha. Entre outras funções, foi editor da coluna "Painel" e do caderno "Cotidiano".

    Edição impressa

    Fale com a Redação - leitor@grupofolha.com.br

    Problemas no aplicativo? - novasplataformas@grupofolha.com.br

    Publicidade

    Folha de S.Paulo 2024