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    Ronaldo Lemos

    O game de 'House of Cards'

    10/03/2015 02h00

    Enquanto o Brasil se prepara para viver momentos de catarse política na vida real, na ficção os políticos jogam videogame. Quem está acompanhando o seriado "House of Cards", produzido e distribuído pelo Netflix, deve ter se deparado com uma situação curiosa no quinto episódio da terceira temporada. O personagem principal, Frank Underwood, um escroque que chega à presidência dos EUA graças à sua falta de caráter, tem uma pausa em suas maquinações ao jogar um inocente joguinho no seu tablet.

    Pois o game existe de verdade. Trata-se de "Monument Valley", um engenhoso quebra-cabeças em três dimensões baseado em ilusões de óptica no melhor estilo de M. C. Escher. É como se o jogador fosse transportado para o universo de Escher, só que na pele de uma solitária princesa chamada Ida, que precisa se deslocar de um lugar para outro manipulando os elementos daquele universo surreal.

    Se a metáfora política é bastante clara, o mais interessante é que a inclusão do game no seriado serve também de demonstração do poder de fogo do Netflix como uma nova mídia "de massas", capaz de influenciar multidões. "Monument Valley" já era um game relativamente bem-sucedido, apesar de não ser nenhum estrondo comercial. No momento do lançamento de "House of Cards", em 27 de fevereiro, suas vendas eram praticamente estáveis, senão declinantes.

    Cinco horas depois do lançamento da temporada (o game aparece no 5º episódio), as vendas começaram a explodir. Entre os dias 28 de fevereiro e 1º de março, o aplicativo saltou da 50ª posição de aplicativos mais vendidos na loja da Apple para a 2ª posição (em outras plataformas o impacto foi similar).

    Esse é um caso a ser analisado com calma por qualquer pessoa interessada no futuro do marketing.

    Uma lição é que a prática do chamado "binge watching", que consiste em assistir a praticamente todos os episódios de uma série assim que eles são lançados, é real e significativa. Para se ter ideia, outra análise demonstrou que no domingo após o lançamento de "House of Cards" o Netflix foi responsável por 45% de todo o tráfego de internet dos EUA. Em suma, um único seriado pode ter impacto no uso da rede como um todo (usualmente essa taxa fica em torno de 30%).

    Executivos do Netflix juram que a aparição do game no seriado não foi uma ação comercial. Ao contrário, teria sido a própria companhia que procurou os autores do game –a empresa Ustwo– para pedir permissão para sua inclusão na trama, gratuitamente.

    É claro que não dá para acreditar que isso aconteceu assim, casualmente. No mínimo, ao fazer isso, o Netflix faz propaganda da própria empresa como nova plataforma de marketing. E mostra para o mercado tudo o que pode fazer. Nas próximas séries, pode esperar a aparição de mais apps, games e outros produtos. E pode ter certeza que isso não sai de graça.

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    ronaldo lemos

    É advogado, diretor do Instituto de Tecnologia e Sociedade do Rio de Janeiro (ITSrio.org). Mestre em direito por Harvard. Pesquisador e representante do MIT Media Lab no Brasil. Escreve às segundas.

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