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    Ronaldo Lemos

    É a produtividade, estúpido!

    14/03/2016 02h00

    Quer participar de mais um debate polarizado? Então basta entrar na discussão sobre quais seriam os benefícios econômicos da internet e das tecnologias da informação. Pergunte o seguinte: os sistemas digitais dos dias de hoje geram ganhos de produtividade econômica?

    Um enorme grupo de economistas "apocalípticos" vai dizer que não. O argumento principal é que as grandes revoluções tecnológicas que produziram níveis elevados de crescimento aconteceram todas entre 1870 e 1970.

    A internet traria apenas incrementos marginais quando comparada ao impacto da presença de um vaso sanitário na casa das pessoas. O crescimento econômico desse período seria devido a mudanças como a eletricidade, a invenção do carro e do rádio, vacinas, água tratada, antibióticos e a universalização da escola.

    O argumento é sintetizado pela frase do economista Robert Solow, que em 1987 disse: "Dá para ver que a era do computador está em toda parte, menos nas estatísticas sobre produtividade".

    O paradoxo é que, apesar do avanço da internet, dos celulares, e da capacidade computacional nos últimos dez anos, esse tem sido um período de baixo crescimento da produtividade. A ponto de economistas como Lawrence Summers dizerem que estamos enfrentando uma "estagnação secular", que não irá embora tão cedo.

    Por outro lado, os economistas "integrados" têm uma visão mais otimista. Argumentam que um problema está na própria estatística. O cálculo do PIB não leva em consideração o valor gerado pelo acesso sem custo a uma enorme gama de serviços e informações pela rede, que vão da Wikipédia aos vídeos do YouTube, passando por amplas bibliotecas de software.

    Nesse sentido, economistas como Ruth Porat (ex-Morgan Stanley e hoje diretora financeira da Alphabet, a empresa controladora do Google) dizem que ainda é cedo para colher esses ganhos de produtividade: estaríamos na infância dessas tecnologias e seus ganhos viriam mais a frente.

    Minha opinião nesse debate é que a discussão é diferente para os países em desenvolvimento. Nestes, as mudanças estruturais do século 20 nem sequer aconteceram por completo. Ainda faltam vacinas, água tratada, boas escolas e vasos sanitários na casa das pessoas. Nesse contexto, a tecnologia é claramente positiva.

    Torna-se não só fonte de ganhos de produtividade em si, mas também ferramenta para apressar o alcance desses outros fatores estruturais. Isso se dá de inúmeras maneiras. Por exemplo, pelo uso das redes para pressão política. Ou ainda como atalho para modelos de produção mais eficientes, cortes de custo, desburocratização e promoção da transparência.

    Com isso, o meu veredito pessoal: em países como o Brasil a tecnologia produz ganhos não só em si mesma, como pode criar condições para demandar a disseminação das privadas e outras conquistas pendentes do século 20.

    ronaldo lemos

    É advogado, diretor do Instituto de Tecnologia e Sociedade do Rio de Janeiro (ITSrio.org). Mestre em direito por Harvard. Pesquisador e representante do MIT Media Lab no Brasil. Escreve às segundas.

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