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    Ronaldo Lemos

    São Paulo pode violar privacidade em programa 'Wi-Fi Livre'

    24/07/2017 02h00

    Jorge Araújo - 1.ago.13/Folhapress
    Homem usa celular próximo a ponto de wi-fi gratuito na praça Dom José Gaspar, em São Paulo
    Homem usa celular próximo a ponto de wi-fi gratuito na praça Dom José Gaspar, em São Paulo

    O pesquisador Bruno Bioni fez na semana passada um alerta importante: São Paulo está caminhando para adotar um sistema de acesso público à internet por wi-fi que pode colocar em risco a privacidade dos paulistanos e das paulistanas.

    A indicação disso decorreu de veto do prefeito João Doria (PSDB) a dois artigos da lei municipal que criou o programa chamado "Wi-Fi Livre". Ao justificar o veto, a prefeitura paulistana alegou que "busca modelos alternativos de provimento e financiamento" da conexão pública à internet, por meio de "parceria com a iniciativa privada que torna possível compreender o perfil dos consumidores e definir uma base de dados assertiva para adequação de anúncios".

    Madame Natasha traduziria esse português truncado da seguinte forma: a prefeitura quer implantar um sistema para coletar e analisar os dados pessoais dos cidadãos e cidadãs que usarem o serviço. Quer também analisar a navegação de cada pessoa e vender esses dados para a iniciativa privada como forma de gerar receita.

    Além de a proposta ser potencialmente inconstitucional, a prefeitura deveria olhar para iniciativas similares em cidades como Nova York para analisar como esse mesmo serviço foi implementado por lá. A cidade seguiu por caminho oposto ao escolhido por São Paulo. Lá, a proteção da privacidade dos cidadãos foi definida como elemento central do acesso público à internet.

    A política de privacidade do serviço nova-iorquino dá aula. A prefeitura de lá não coleta nenhum histórico de navegação dos usuários, nem vende nenhuma informação para terceiros. Qualquer dado coletado para gerir o serviço é anonimizado e qualquer exceção a essas regras depende de um consentimento específico ("opt-in") do cidadão, sempre limitado a propósitos específicos.

    Conversei há pouco com o CTO (chefe de tecnologia) da cidade de Nova York, Miguel Gamino Jr. Ele ressaltou que proteger a privacidade não impediu a prefeitura de fazer parcerias público-privadas para custear o serviço de wi-fi. Ao contrário, a confiança derivada dessa proteção ampliou o leque de parceiros interessados.

    Nas palavras dele: "Fornecer acesso público à internet só faz sentido se isso for benéfico aos cidadãos. As pessoas não deveriam ter de escolher entre privacidade e oportunidade. É preciso oferecer as duas coisas". A entrevista completa com ele está no episódio sobre cidades inteligentes da minha série "Expresso Futuro", disponível on-line no Futura Play (Canal Futura).

    O tema é especialmente importante porque os principais usuários do wi-fi público são a parcela mais vulnerável da população, que não possui planos pós-pagos de celular com boa conexão. Ignorar os direitos desses usuários serve apenas para aumentar disparidades.

    De nada adianta parecer moderno na superfície e atuar de forma paroquial na hora de implementar políticas públicas sobre tecnologia. Se a prefeitura quer fazer de São Paulo uma cidade global, deveria ao menos aprender com o que já existe.

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    É advogado, diretor do Instituto de Tecnologia e Sociedade do Rio de Janeiro (ITSrio.org). Mestre em direito por Harvard. Pesquisador e representante do MIT Media Lab no Brasil. Escreve às segundas.

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