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    Ronaldo Lemos

    Distritão privilegia políticos profissionais ou celebridades

    14/08/2017 02h00

    Renato Costa/FramePhoto/Folhapress
    Sessão do Congresso Nacional, sob o comando de seu presidente, o senador Renan Calheiros (PMDB-AL), para votação de vetos presidenciais e da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2017
    Sessão do Congresso Nacional, sob o comando do senador Renan Calheiros (PMDB-AL)

    Dá para concordar que, quanto mais pluralidade nas profissões dos deputados e senadores que integram o Congresso Nacional, maior será sua representatividade.

    Todos nós gostaríamos de ver mais professores, engenheiros, enfermeiros, cientistas e outros profissionais da sociedade em Brasília.

    O caso da ciência é especialmente importante. Sua representatividade política hoje é praticamente nula.

    Isso passa a infeliz ideia de que ciência e tecnologia não têm nenhuma importância, podendo viver muito bem sem nenhuma voz. Essa ideia é equivocada por vários motivos.

    Primeiro porque no mundo de hoje nenhum país conseguirá se desenvolver sem colocar ciência e tecnologia no rol de prioridades.

    Segundo porque cientistas, diferentemente de políticos profissionais, são especialistas em estabelecer a verdade (graças ao método científico). Mercadoria que anda em falta no mundo e na política brasileira.

    Há várias ações em curso para tentar melhorar a representatividade da ciência na política. Nos Estados Unidos, foi lançado o movimento da sociedade civil chamado "314 Action", que tem por missão apoiar e eleger cientistas para o Congresso, Assembleias Estaduais e Câmaras Municipais daquele país.

    Seu objetivo é "defender agressivamente uma agenda em favor da ciência, da tecnologia, da engenharia e da matemática".

    Já no Brasil, a reunião anual da SBPC (Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência), ocorrida há algumas semanas, discutiu ideias como a criação de um partido para representar a ciência no país, ou, ainda, estratégias para que todo partido possa ter um número mínimo de cientistas candidatos.

    Afinal, qualquer país se beneficia ao ter a ciência representada.

    Todas essas ideias são interessantes. Só que nenhuma terá nenhum efeito se o Brasil aprovar o chamado distritão como sistema eleitoral.

    O distritão é, por excelência, o inimigo de todo e qualquer candidato que venha da sociedade.

    Ele privilegia apenas políticos profissionais que controlam currais eleitorais ou celebridades, únicos capazes de angariar sozinhos volumes avassaladores de votos.

    Assim, a eleição se torna uma disputa de popularidade, e não de representatividade. Nenhum profissional oriundo da sociedade, incluindo cientistas, terá chance nesse sistema.

    Se o Brasil depende de múltiplas capacidades para construir um novo modelo de desenvolvimento, o distritão corta tudo pela raiz. Ele privilegia um governo de manipuladores, afastando ainda mais o Estado da sociedade.

    Como diz uma antiga frase da política norte-americana: "Se você não tem lugar à mesa, é porque será servido de jantar".

    O distritão torna a mesa da política brasileira inacessível. E, por consequência, transforma a sociedade em jantar.

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    ronaldo lemos

    É advogado, diretor do Instituto de Tecnologia e Sociedade do Rio de Janeiro (ITSrio.org). Mestre em direito por Harvard. Pesquisador e representante do MIT Media Lab no Brasil. Escreve às segundas.

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