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    Ronaldo Lemos

    Brasil perde do Uruguai na agenda digital

    28/08/2017 02h00

    Pablo Porciuncula - 29.nov.2011/AFP
    ORG XMIT: PP012 Schoolchildren compete in the first Mathematics Marathon of the "Ceibal Project", on November 29, 2011 in Montevideo. The Ceibal Project is the Uruguayan equivalent to the 'One Laptop per Child' project, through which every public primary schoolchild is equipped for free with a personal computer and free access to an educational net. AFP PHOTO/Pablo PORCIUNCULA
    Alunos de Montevidéu em maratona de matemática do "Ceibal", plano de tecnologia para a educação

    Na semana passada, o Uruguai realizou um grande evento para comemorar os dez anos da implantação de sua agenda digital.

    O evento contou com a presença do atual presidente, Tabaré Vázquez, e também de um ex-presidente da Estônia, país que é apontado hoje como modelo na implementação de políticas digitais.

    Quem planta antes colhe cedo. No país vizinho, a agenda digital foi criada em 2007. Os dez anos que se seguiram provam claramente os benefícios do investimento feito.

    Hoje, 100% das escolas do Uruguai estão conectadas à internet em banda larga. Mais do que isso, 92% das escolas estão conectadas com fibra óptica de alta velocidade. Tudo isso graças somente a um dos componentes do programa, chamado de "Plano Ceibal". Esse plano investiu em tecnologia para revolucionar a educação. E revolucionou.

    O contraste com o Brasil é penoso. Aqui, apenas 1% das escolas públicas têm conexão maior do que 20 Mbps. Esse é o piso do que é considerado banda larga hoje nos EUA.

    No Brasil mais de 45% das escolas públicas recebem conexão menor do que 2 Mbps. Isso significa que um único aluno assistindo a um vídeo é suficiente para congestionar a rede.

    O plano uruguaio foi ainda mais ambicioso. Implantou desde logo uma lei de proteção aos dados pessoais e criou uma agência para cuidar desse tema. Com isso, matou dois coelhos. Deu segurança jurídica para o setor privado investir em análise de dados, fixando as regras do jogo.

    Deu também tranquilidade ao cidadão, permitindo que o governo investisse pesado em serviços digitais e dados, sem que isso levasse a vigilância, à venda de dados para o setor privado ou a outras ameaças à privacidade.

    Só lembrando, o Brasil nem sequer possui uma lei de proteção de dados pessoais. Essa agenda aqui está atrasada há mais de 20 anos.

    A atual aposta do Uruguai é a certificação digital. Nesse sentido, o país criou um RG digital, que permite acessar serviços governamentais e praticar todos os atos da burocracia pela internet. A meta é que até 2020 esse RG esteja sendo usado por 30% da população.

    No Brasil, acabamos de perder a oportunidade de fazer algo similar com a lei que criou o novo RG (RIC - Registro de Identidade Civil). A lei foi aprovada em 2017, mas parece ter sido escrita em 1998, porque ainda aposta no papel.

    Ao mesmo tempo, os certificados digitais no Brasil são usados por apenas 2,5% da população e são caríssimos (custam de R$ 180 a R$ 460). O que é inaceitável.

    Os derrotistas vão dizer que no Uruguai é fácil fazer tudo isso, porque o país tem apenas 3,4 milhões de habitantes. Estão errados. O Brasil tem algo que o Uruguai não tem: escala.

    Se tivesse também gestão, ideias e planejamento, poderia fazer muito mais que o país vizinho fez nos últimos dez anos. Poderia ser líder na América Latina em políticas digitais. Não é o caso.

    O país ainda patina. Fala muito e faz pouco. Ataca o que dá certo. E se alia com o que não tem futuro.

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    É advogado, diretor do Instituto de Tecnologia e Sociedade do Rio de Janeiro (ITSrio.org). Mestre em direito por Harvard. Pesquisador e representante do MIT Media Lab no Brasil. Escreve às segundas.

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