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    Rosely Sayão

    O que uma criança pode aprender na escola, fazendo o mesmo que em casa?

    24/05/2016 02h00

    Anos atrás, fui visitar uma escola de educação infantil. A filha de uma amiga queria colocar seu neto naquela escola e ela, como educadora, não concordava. Mas, como "santo de casa não faz milagres", ela pediu minha ajuda para convencer a filha de que a escola não era mesmo boa para crianças.

    Não precisei ouvir a explanação da orientadora a respeito do projeto pedagógico aplicado ou pretendido, porque foi fácil entender. Em duas salas com crianças –uma delas um local destinado para os menores dormirem– havia aparelhos de televisão. Um deles estava ligado em um canal infantil de TV a cabo e no outro passava um DVD de desenho animado. Nem precisa dizer que as crianças que lá estavam olhavam fixamente para o aparelho, quase hipnotizadas.

    Foi mais ou menos na mesma época que percebi outra prática adotada pelas escolas: o tal "dia do brinquedo", que costuma ser semanal. Nesse dia, as crianças levavam um brinquedo de casa para a escola.

    Depois de testemunhar essas duas situações, descobri que muitas, muitas outras escolas de educação infantil adotam essas práticas.

    Aí me interessei pelo ensino fundamental, pela primeira parte dele, e descobri outra prática muito comum: em quase todas as salas havia gibis empilhados. Achei que eles seriam utilizados para alguma prática pedagógica, mas não eram.

    Os gibis eram geralmente usados quando os alunos tinham alguma tarefa e –inevitavelmente– levavam tempos muito diferentes para finalizá-la. Os que terminavam antes eram dirigidos aos gibis. Assim, lá ficavam distraídos e –o mais importante para a escola– quietos. Bem, nem todos, para o pesar das instituições!

    O dia do brinquedo tem se transformado um pouco em diversas escolas. Em vez de levar um brinquedo, as crianças têm um dia em que podem levar alguma traquitana tecnológica.

    Se você, caro leitor, tem filhos que frequentam escola de educação infantil ou ensino fundamental, e lá ocorrem fatos como esses que citei, seria interessante se perguntar –e depois à escola– qual é o objetivo pedagógico dessas situações. De antemão, posso afirmar que não há nenhum objetivo pedagógico!

    O que uma criança pode aprender fazendo, na escola, a mesma coisa que faz em casa? Absolutamente nada. E ainda arrisco dizer que o objetivo que a escola tem ao agir assim é semelhante ao dos pais quando querem um pouco de sossego. Dar gibis, ligar a televisão, dar o tablet para a criança significa nada mais nada menos do que um "Fica quieto, menino!", com aparência mais agradável para o filho.

    Claro que é possível usar gibis, aparelhos de televisão e tablets, por exemplo, com objetivo pedagógico, mas aí o contexto é bem diferente.

    As pesquisas a respeito do uso da tecnologia por crianças não apresentam consenso, mas um, pelo menos, há: na escola, ela deve ser utilizada como recurso pedagógico bem planejado, organizado, com objetivos claros e didáticos para os alunos. Deve, portanto, resultar em aprendizagem.

    Caro leitor, 15 minutos –ou 10, ou 5– na escola são muito preciosos para a aprendizagem do alunado para serem desperdiçados dessa forma!

    rosely sayão

    Escreveu até julho de 2017

    Psicóloga e consultora em educação, fala sobre as principais dificuldades vividas pela família e pela escola no ato de educar e dialoga sobre o dia a dia dessa relação.

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