• Colunistas

    Saturday, 18-May-2024 21:38:49 -03
    Ruy Castro

    Música e tiroteio

    27/04/2016 02h00 Erramos: esse conteúdo foi alterado

    RIO DE JANEIRO - O roqueiro Brian Johnson, vocalista do grupo australiano AC/DC, anunciou sua aposentadoria. Os médicos o advertiram de que, se ele continuasse atuando em estádios barulhentos com o AC/DC, ficaria completamente surdo. Johnson acatou. Nos últimos anos, vinha entrando fora do tom ou do tempo nas músicas, porque não sabia o que os colegas estavam tocando. O curioso é que estes não percebiam. Afinal, em meio a 1 milhão de decibéis, ninguém está escutando nada, mesmo.

    Johnson é um homem de 68 anos, idade provecta para roqueiros. Faria melhor se se dedicasse a matar palavras cruzadas ou colecionar selos. O rock é – ou era – uma música jovem e rebelde, e não fica bem ter como um de seus expoentes um hippie velho e de boina. Mas o próprio AC/DC também já está na praça há 43 anos, mais longevo do que as big bands do passado, cuja aposentadoria o rock decretou nos anos 60 porque elas eram "velhas". Hoje, o rock é a música mais velha do mundo.

    Brian não é o primeiro roqueiro a ficar surdo. Também foram afetados Neil Young, Ozzy Osbourne, Eric Clapton, Brian Wilson (dos Beach Boys), Pete Townshend (do The Who) e o produtor musical dos Beatles, George Martin – certamente de tanto ouvir "Helter Skelter". Exceto por Martin, morto há pouco, você não ouviu falar muito deles ultimamente. Devem estar em casa, afinando os aparelhos de ouvido.

    Um exemplo de por que essa surdez acontece está no vídeo gravado na casa de shows Bataclan, em Paris, na noite do atentado terrorista, em 2015. O grupo Eagles of the Death Metal se apresentava quando os criminosos entraram e começaram a disparar. Pelo áudio, não é possível distinguir entre a música e o tiroteio. Parece uma coisa só.

    Como são linguagens excludentes, alguma coisa devia estar errada, ou com a música ou com o tiroteio.

    ruy castro

    É escritor e jornalista. Considerado um dos maiores biógrafos brasileiros, escreveu sobre Nelson Rodrigues, Garrincha e Carmen Miranda. Escreve às segundas,
    quartas, sextas e sábados.

    Edição impressa

    Fale com a Redação - leitor@grupofolha.com.br

    Problemas no aplicativo? - novasplataformas@grupofolha.com.br

    Publicidade

    Folha de S.Paulo 2024