RIO DE JANEIRO - Em abril de 1966, os Beatles gravaram em Londres seu LP "Revolver". Uma das faixas era a balançada "Doctor Robert" –"Ring my friend/ I said you call/ Doctor Robert...", lembra-se? Onze anos antes, em março de 1955, o saxofonista Charlie Parker, um dos gênios indisputados do jazz, morreu de cirrose aguda no apartamento da baronesa Nica de Koenigswarter, no hotel Stanhope, em Nova York. OK, qual é a relação?
Assinada por Lennon e McCartney, "Doctor Robert" era só de John Lennon. Em 1967, ele revelou que a letra se referia a um médico, Dr. Robert Freymann, que os Beatles tinham conhecido nos EUA em 1964, famoso por aplicar injeções de vitamina B12 turbinadas com anfetamina. "If you're down, he'll pick you up", dizia a letra –se você estiver mal, ele te joga pra cima.
Quando Parker bateu à porta de Nica vomitando sangue, ela ligou para seu médico, que morava ali perto. Um livro lançado há pouco e ainda inédito aqui, "Nica's Dream", de David Kastin, faz a conexão: era o Dr. Robert Freymann. Ele estancou a sangueira, mas Parker recusou-se a ser internado. Freymann deixou que ficasse no apartamento, aos cuidados de Nica, e prometeu ir vê-lo duas ou três vezes por dia. Fez isto, mas, no terceiro dia, Parker morreu.
Freymann era um dos médicos de Nova York que "tratavam" de celebridades com as injeções mágicas. O principal deles era o Dr. Max "Feelgood" Jacobson, cujos clientes incluíam Truman Capote, Tennessee Williams, o cantor Eddie (pai de Carrie) Fisher, o compositor Alan Jay Lerner e o casal Kennedy –que ele atendia na Casa Branca. Tanto Jacobson quanto Freymann foram expulsos da Associação Médica de Nova York nos anos 70. Todos os seus clientes morreram relativamente cedo.
Pelo visto, John Lennon não se tratou com Dr. Robert. Só cantou os seus talentos. Mais seguro assim.
É escritor e jornalista. Considerado um dos maiores biógrafos brasileiros, escreveu sobre Nelson Rodrigues, Garrincha e Carmen Miranda. Escreve às segundas,
quartas, sextas e sábados.