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    Samuel Pessôa

    As coligações proporcionais

    14/04/2013 03h15

    A imprensa noticiou que a Câmara analisará nas próximas semanas a proposta de reforma política relatada pelo deputado Henrique Fontana (PT-RS). Estão contemplados uma PEC (Proposta de Emenda à Constituição) e um PL (projeto de lei). O PL trata do financiamento público da campanha e do voto em lista pré-ordenada pelo partido. Nesta coluna, abordo o tema principal da PEC: o fim das coligações partidárias.

    O voto em um deputado ou em um vereador representa uma escolha dupla. O eleitor vota no candidato e no partido. Após a eleição, a definição das bancadas de cada partido é feita também em duas etapas. Na primeira, determina-se o tamanho da bancada de cada partido no Legislativo. Na segunda, determina-se a composição das bancadas.

    Assim, na primeira etapa, totalizam-se os votos dos partidos --lembre-se de que o voto no Legislativo é duplo, na pessoa e no partido--, e sua proporção em relação aos votos válidos determina o tamanho da bancada.

    Ou seja, o tamanho da bancada de cada partido no Legislativo é proporcional à votação da legenda. É por esse motivo que nosso sistema de escolha dos representantes do Legislativo se chama proporcional.

    Se um partido tiver menos do que o suficiente para ocupar uma vaga --ou seja, se tiver menos votos do que o mínimo necessário para ter um representante, chamado de quociente eleitoral--, não terá nenhum representante no Legislativo. Trata-se da cláusula de barreira implícita do sistema proporcional.

    Na segunda etapa, determinam-se para cada partido os candidatos em forma decrescente de votação. Todos os candidatos dessa lista até o limite do tamanho da bancada, determinado na etapa anterior, estão eleitos.

    No Brasil, há um instituto que altera a lógica do voto proporcional. Trata-se da coligação para a eleição proporcional. A mecânica da coligação é a seguinte: dois ou mais partidos decidem fazer campanhas conjuntas para o Legislativo.

    Assim, a campanha, principalmente o horário eleitoral, será conjunta. Em particular, o tempo da coligação no horário gratuito será a soma dos tempos de cada partido.

    A coligação para a eleição proporcional quebra a lógica do voto proporcional. O motivo é que o cálculo do número de vagas para a coligação e os candidatos que ocuparão as vagas será feito como se a coligação fosse um único partido.

    Isto é, após definido o número de vagas da coligação, a determinação dos candidatos da coligação que ocuparão as vagas será feita de acordo com a lista dos mais votados da coligação (e não de cada partido).

    Um partido pequeno que acredita que terá menos votos que o quociente eleitoral, mas tem um ou dois candidatos que serão bem votados, está disposto a participar de uma coligação. O motivo é que esses candidatos poderão estar bem posicionados na lista da coligação e, portanto, serem eleitos (mesmo que o total de votos ao pequeno partido for menor que o quociente eleitoral).

    O interesse dos partidos maiores com a coligação é aumentar o tempo do horário eleitoral gratuito para seu candidato ao cargo majoritário. Essa troca explica boa parte das coligações. Muitas vezes envolve partidos em pontos antagônicos do espectro ideológico.

    Adicionalmente, as coligações para a eleição proporcional permitem a sobrevivência de pequenos partidos sem que eles representem interesses ou grupos legítimos da sociedade. É nesse sentido que essa modalidade de coligação permite as legendas de aluguel.

    O sistema proporcional no Brasil produz enorme fragmentação partidária. O instituto da coligação proporcional eleva em muito essa fragmentação. Assim, a proibição de coligações para a eleição proporcional será bem-vinda, pois contribuirá para reduzir a fragmentação partidária, mantendo o princípio da proporcionalidade, importante para garantir a representação das minorias.

    Por outro lado, o argumento dos dirigentes dos partidos pequenos de que o fim das coligações proporcionais inviabilizaria sua sobrevida é incorreto. Os recursos do fundo partidário e o horário eleitoral gratuito são suficientes para que um pequeno partido sobreviva.

    A história do PT, que, quando pequeno, foi refratário às coligações, demonstra que há espaço para a sobrevivência e o crescimento de um pequeno partido, desde que tenha substância.

    samuel pessôa

    É físico com doutorado em economia, ambos pela USP, sócio da consultoria Reliance e pesquisador associado do Ibre-FGV. Escreve aos domingos.

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