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    Samuel Pessôa

    PIB do segundo trimestre

    31/08/2014 02h00

    O IBGE divulgou o resultado do crescimento do PIB referente ao segundo trimestre ante o trimestre anterior, com retrocesso de 0,6%, desempenho pior do que o 0,4% projetado pelo mercado e por nós no Ibre.

    A surpresa negativa de 0,2 ponto percentual derivou da agropecuária, que veio abaixo do esperado. O resultado da indústria foi o que se esperava: recuo de 1,5%, com a indústria de transformação caindo 2,4%, e a construção civil, 2,9%.

    Pela ótica da demanda agregada, o maior desapontamento ficou com o investimento em capital fixo, que recuou 5,3%. Quando o investimento cai, as importações também recuam, de forma que a demanda externa -exportações líquidas das importações- contribuiu para que o tombo não fosse tão forte.

    Pelo andar da carruagem, o PIB fechará o ano de 2014 com crescimento em torno de 0,5%!

    Tenho mantido um debate nesta coluna com vários colegas sobre o papel da crise internacional na redução do desempenho de nossa economia. No primeiro triênio de Dilma, o crescimento em média foi de 2,1% ao ano, ante expansão média de 4% nos oitos anos de Lula.

    Há analistas que consideram que essa forte desaceleração é consequência do freio da economia global. Argumentam que o Brasil tem estrutura produtiva de economia moderna e, mesmo sendo mais pobre, deve ser comparado aos desenvolvidos. Estudos econométricos sofisticados suportam essa leitura.

    De meu lado, tenho argumentado que é difícil imaginarmos que uma das economias mais fechadas, como a brasileira, seja justamente uma das mais afetadas pela dinâmica da economia mundial.

    Adicionalmente, os termos de troca ainda se encontram em nível significativamente maior do que os observados ao longo dos dois mandatos de Lula ou de FHC. Esse é um bom debate que está em aberto.

    No entanto, parece-me que, com relação ao freio da atividade em 2014, não há muitas dúvidas. Nossa parada deveu-se essencialmente a motivos domésticos. O maior fator foi o investimento. Para ter uma ideia, no segundo trimestre, esteve no mesmo nível do primeiro trimestre de 2010. Recuamos a um patamar menor do que o observado há quatro anos.

    Não parece que a crise internacional explique retração de tal monta. Nos últimos quatro trimestres, o investimento recuou 11%. Nos quatro trimestres em seguida à crise das hipotecas, em setembro de 2008, o investimento recuara 9%. No entanto, nada ocorre na economia mundial que se aproxime da crise aguda que vivenciamos após a falência do banco Lehman Brothers.

    Vivemos atualmente uma crise crônica em diversas economias centrais, em razão da necessidade de digerir excessos de investimento imobiliário e, portanto, de dívidas que foram contraídas no período anterior à crise aguda de 2008.

    A economia americana não crescerá os 3% que parecia que iria crescer em 2014, mas apresentará uma expansão moderada de 2% ou pouco mais. A Europa provavelmente ficará no zero a zero, e a China deve crescer os 7,5% dos últimos anos.

    Penso que nosso freio em 2014 deveu-se a dois fatores.

    Primeiro, fortíssima piora das expectativas. Esta, por sua vez, ocorreu em razão das incertezas que envolveram a realização da Copa, alimentadas pelas manifestações de junho de 2013, e da forte dúvida em relação ao novo regime de política econômica que vigorará no próximo governo, a partir de 2015.

    O segundo motivo que, penso, explica a desaceleração de nossa economia é o impacto sobre a eficiência econômica do regime de política econômica que ficou conhecido por nova matriz econômica.

    Como tenho insistido neste espaço, o regime de política econômica excessivamente discricionário produz muita incerteza e perturba demais a atividade. Setores inteiros da economia têm que se adaptar para trabalhar alguns trimestres com excesso de pedidos, horas extras e estoques muito baixos, para, nos trimestres seguintes, deparar-se com acumulação não intencional de estoques, redução de turnos e até necessidade de empregar o novo sistema de "lay-off".

    Muito chacoalho e pouca previsibilidade resultam em forte desaceleração, sem que colhamos os frutos de uma significativa redução da inflação. Fecharemos o ano com PIB a 0,5% e IPCA a 6,4%!

    samuel pessôa

    É físico com doutorado em economia, ambos pela USP, sócio da consultoria Reliance e pesquisador associado do Ibre-FGV. Escreve aos domingos.

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